«O modo de locomoção
do espírito a que nos convida parece feito à nossa medida, é experimental de
fazer em casa ou de ver na rua, e nele entramos sem iniciação ou reverência,
sem baixar a cabeça numa porta estreita ao cimo de uma escada.
O percurso escolhido
vai dos sentidos às técnicas pela experiência, da óptica dos espelhos, das
lentes, do caleidoscópio ou do arco-íris, aos ímanes, à electricidade, às
alavancas e aos foguetões, à pressão e ao atrito, à flutuação dos barcos, à
tensão superficial, ou ainda ao peso do ar, aos termómetros, aos fenómenos do
som. Pelo caminho, ensina-nos a ferver água numa caixa de papel, a fazer um
sempre-em-pé e a gostar de perceber o porquê das coisas.
Rómulo de Carvalho
veio recordar-nos, mais uma vez, como a Física também é quotidiana. A sua obra
de divulgação científica, agora em reedição, ocupa um lugar destacado na
história da divulgação em Portugal.» [Do Prefácio de José
Mariano Gago]
Rómulo
de Carvalho (1906-1997) foi durante mais de quarenta anos professor do ensino
secundário. Iniciou a sua carreira em Lisboa em 1934. Em 1950, foi transferido para
Coimbra, onde leccionou durante sete anos, fixando-se de novo e definitivamente
em Lisboa, onde veio a reformar-se em 1974, aos 68 anos.
Nas
escolas onde exerceu a profissão, designadas à época por «liceus», ensinou
Física e Química, disciplinas em que se formara na Universidade do Porto, entre
1928 e 1931. As suas actividades docentes e acção pedagógica deixaram marcas
indeléveis nas escolas onde trabalhou. Desde logo, na formação e nas escolhas
profissionais de numerosos jovens que lhe passaram pelas mãos ou que receberam
a sua influência através dos manuais escolares que publicou e que o
notabilizaram como professor, ou ainda através dos livros de divulgação
científica dirigidos a jovens e a menos jovens.
Neste
caso estão, entre muitos outros trabalhos, os livrinhos da colecção «Ciência
para Gente Nova» (oito títulos publicados entre 1952 e 1962); a obra pioneira Física para o Povo (dois volumes, de
1968) e os dezoito Cadernos de Iniciação
Científica publicados entre 1979 e 1985, já depois de se ter aposentado.
O
professor notabilizou-se também como investigador da história das ideias e da
actividade científica e técnica em Portugal, no século de setecentos, e dos seus
protagonistas — pessoas e instituições —, devendo-se-lhe, neste campo, mais de
três dezenas de publicações, entre 1954 e 1996, a que se somam outros tantos
estudos diversos relacionados com o mesmo tema. Deve-se-lhe a primeira e ainda hoje
única História do Ensino em Portugal, desde
a fundação da nacionalidade até ao fim do regime de Salazar-Caetano.
Em
1996, por ocasião dos seus 90 anos, Rómulo de Carvalho viu publicamente reconhecido
o mérito da obra de uma vida, ao ser instituído, por decisão do governo
português, o dia do seu aniversário — 24 de Novembro — como Dia Nacional da
Cultura Científica.
Rómulo
de Carvalho revelou-se publicamente como poeta publicando aos 50 anos de idade
um primeiro livro de poemas. Foi então que nasceu António Gedeão, de quem se
pode dizer que a sua poesia, ao mesmo tempo simples e elaborada, profundamente
enraizada na sua terra, exprime a alegria, as dores, as inquietações e as
contradições, a compaixão pelo outro e o amor da natureza e das coisas que
afligem todo o ser humano.
[Frederico Carvalho
Setembro de 2012]