30.4.20

Ethan Frome, de Edith Wahrton




«A aldeia jazia sob uma camada de dois pés de neve, com montões mais altos nas esquinas ventosas. No céu de chumbo, os vértices da Ursa brilhavam como pingentes de sincelo, e Órion dardejava o seu frio lume. A lua escondera-se, mas a noite estava tão transparente que as fachadas brancas entre ulmeiros pareciam pardas em contraste com a neve, que os maciços de arbustos manchavam de negro, e sobre cuja ondulação infinita as janelas da cave da igreja projectavam grandes focos de luz amarela.
O jovem Ethan Frome percorreu rapidamente a rua deserta, passando pelo banco, pela nova loja de Michael Eady, toda em tijolo, e pela casa do advogado Varnum, com o seu par de espruces da Noruega a ladear o portão. Diante do portão dos Varnums, onde a estrada começava a descer para o vale de Corbury, a igreja erguia o seu esguio e branco campanário e o seu peristilo estreito. No momento em que o jovem Ethan para lá se dirigiu, as janelas do andar de cima desenhavam uma galeria negra ao longo da parede lateral do edifício, mas das frestas do piso inferior, do lado onde o terreno descia quase a pique até à estrada de Corbury, jorravam longos veios de luz, iluminando um grande número de trilhos recentes no carreiro que conduzia à porta da cave, e dando a ver, no telheiro adjacente à igreja, uma fila de trenós com os seus cavalos cobertos por mantas grossas.» [pp. 23-24]


Ethan Frome (trad. Ana Luísa Faria) e outras obras de Edith Wharton estão disponíveis em https://relogiodagua.pt/autor/edith-wharton/

Sobre Carta de Uma Desconhecida, de Stefan Zweig




Um romancista vienense em voga toma conhecimento, ao ler o seu correio, de que uma mulher o ama secretamente, com um amor absoluto e que dura há vários anos.
Intrigado, o escritor apercebe-se de que essa paixão surgiu numa rapariga de apenas 13 anos, quando ele próprio tinha 25, e que continua na mulher já adulta.
É uma paixão que vive do mistério e tem aspetos obsessivos e perversos, e uma tendência para a autodestruição.


Esta e outras obras de Stefan Zweig estão disponíveis em https://relogiodagua.pt/produto/carta-de-uma-desconhecida/

29.4.20

Sobre Movimento Total, de José Gil




«No começo era o movimento.
Não havia repouso porque não havia paragem do movimento. O repouso era apenas uma imagem demasiado vasta daquilo que se movia, uma imagem infinitamente fatigada que afrouxava o movimento. Crescia-se para repousar, misturavam-se os mapas, reunia-se o espaço, unificava-se o tempo num presente que parecia estar em toda a parte, para sempre, ao mesmo tempo. Suspirava-se de alívio, pensava-se ter-se alcançado a imobilidade. Era possível enfim olhar-se a si próprio numa imagem apaziguadora de si e do mundo.
Era esquecer o movimento que continuava em silêncio no fundo dos corpos. Microscopicamente. Porque, como se passaria do movimento ao repouso se não houvesse já movimento no repouso?
No começo não havia pois começo.
No começo era o movimento porque o começo era o homem de pé, na Terra. Erguera-se sobre os dois pés oscilando, visando o equilíbrio. O corpo não era mais que um campo de forças atravessado por mil correntes, tensões, movimentos. Buscava um ponto de apoio. Uma espécie de parapeito contra esse tumulto que abalava os seus ossos e a sua carne.
Então a linguagem nascia num relâmpago, os sons combinavam-se, as palavras encadeavam-se, os sentidos incendiavam-se, a marcha desencadeava os seus passos na alegria, e hesitava na angústia de cair. A vida transbordava.
O bailarino retoma o seu corpo nesse momento preciso em que perde o seu equilíbrio e se arrisca a cair no vazio.» [Movimento Total, pp. 13-14]


Esta e outras obras de José Gil estão disponíveis em https://relogiodagua.pt/autor/jose-gil/

Sobre Pessoas Normais e a adaptação televisiva




«Dizer que a obra de Sally Rooney representa o Zeitgeist seria um eufemismo. […] A adaptação de Abrahamson merece igual louvor, por traduzir o material de origem com tanta compaixão […].» [James Patterson, a propósito da transmissão da série num dos canais da RTÉ. Texto disponível aqui.]

Pessoas Normais (trad. Ana Falcão Bastos) está disponível em https://relogiodagua.pt/produto/pessoas-normais/

28.4.20

Sobre Mataram a Cotovia — O Romance Gráfico, de Harper Lee e Fred Fordham




Um retrato assombroso de raça e classes sociais, inocência e injustiça, hipocrisia e heroísmo, tradição e transformação no Sul Profundo dos EUA dos anos trinta. 
Mataram a Cotovia, de Harper Lee, mantém a mesma atualidade que tinha em 1960, quando foi escrito, durante os turbulentos anos do Movimento dos Direitos Civis nos Estados Unidos.
Agora, este aclamado romance renasce como romance gráfico. Scout, Jem, Boo Radley, Atticus Finch e a pequena cidade de Maycomb, no Alabama, são representados de forma nítida e comovente pelas ilustrações de Fred Fordham.

“Este fantástico romance gráfico revela uma nova perspetiva aos antigos leitores do livro, sendo ao mesmo tempo uma bela introdução para jovens ou para qualquer adulto a quem esta incrível história tenha passado ao lado.” [USA Today]


O romance e o romance gráfico de Mataram a Cotovia estão disponíveis em https://relogiodagua.pt/autor/harper-lee/

Os próximos livros da Relógio D’Água: «Tonio Kröger», de Thomas Mann




Nos dias que se seguem, vamos publicar aqui as primeiras páginas de algumas das obras que vão ser lançadas quando as livrarias reabrirem.
Hoje apresentamos «Tonio Kröger», de Thomas Mann (trad. Helena Topa).





Outras obras de Thomas Mann já publicadas pela Relógio D’Água estão disponíveis em https://relogiodagua.pt/autor/thomas-mann/

Sobre As Confissões de Félix Krull, Cavalheiro de Indústria, de Thomas Mann



«Nas horas vagas da minha aposentação, no momento em que pego na pena para registar as minhas recordações (são de corpo, mas cansado, tão cansado que a narrativa avançará por pequenas etapas, mas com frequentes interrupções), no momento — dizia — em que, com a minha letra nítida e agradável, me preparo para fazer as minhas confissões ao paciente papel, sou assaltado por um escrúpulo fugitivo. Com a minha cultura e a minha instrução, estarei eu à altura deste empreendimento intelectual? Como o que tenho a dizer se refere às minhas experiências, erros e paixões estritamente pessoais e directos, a minha dúvida incide apenas sobre o ritmo e a qualidade do meu modo de expressão. Ora eu penso que, em assuntos desses, os estudos aturados e levados até ao fim têm menos importância do que uma vocação natural e uma educação cuidada desde o berço.» [As Confissões de Félix Krull, Cavalheiro de Indústria, p. 9]

As Confissões de Félix Krull, concebido embora antes da I Guerra Mundial, é o seu último livro. Neste romance, parte do qual decorre em Lisboa, Thomas Mann atinge um dos pontos culminantes da sua criação com o personagem Krull, um imaginativo e amável impostor.


As Confissões de Félix Krull, Cavalheiro de Indústria (trad. Domingos Monteiro) e outras obras de Thomas Mann estão disponíveis em https://relogiodagua.pt/autor/thomas-mann/

Sobre Decameron, de Giovanni Boccaccio




No Verão de 1348, enquanto a peste negra lhes arrasa a cidade, dez jovens florentinos refugiam-se no campo, onde se entretêm a contar histórias durante os dez dias que ali irão permanecer.
Boccaccio reviu e reescreveu Decameron em 1370-71, fixando um texto que exprime em termos narrativos o espírito laico da burguesia comercial que afirmava então o seu protagonismo na vida social europeia. Fá-lo através de uma estrutura equilibrada em simetrias naturais, com um variado desfile de peripécias, situações e personagens, do simples popular ao libertino, num registo que vai da sátira de uma religião em crise à emoção poética perante a dor ou a morte.


Os dois volumes de Decameron (trad. Urbano Tavares Rodrigues) estão disponíveis em https://relogiodagua.pt/produto/decameron-2-vols/

Ana Margarida de Carvalho na sessão do Plano Municipal de Leitura de Matosinhos




Ana Margarida de Carvalho participa na sessão do Plano Municipal de Leitura de Matosinhos, uma iniciativa da Câmara Municipal de Matosinhos e da Biblioteca Municipal Florbela Espanca.
A sessão será amanhã, quarta-feira, 29 de abril, às 18.30, com moderação de Sérgio Almeida e decorrerá em streaming, via Facebook Live.

A sessão pode ser seguida na página de Facebook da Relógio D’Água.

27.4.20

Sobre A Guerra dos Mundos, de H. G. Wells




A Guerra dos Mundos, a par de O Homem Invisível e A Máquina do Tempo, foi uma obra marcante na criação da ficção científica como género literário.
H. G. Wells partiu do relativo desconhecimento que então se tinha sobre Marte e dos progressos da tecnologia para criar uma obra de suspense, espanto e terror.
Tudo começa quando o narrador toma conhecimento da queda de estranhos objetos vindos de Marte nos tranquilos campos dos arredores de Londres. A multidão acorre e depara com misteriosos cilindros de onde saem marcianos que vão ameaçar de destruição todo o país e a civilização tal como era então conhecida.
Esta antevisão do choque entre os habitantes da Terra e os de outros planetas iria servir de modelo a toda uma variante da ficção científica. O seu potencial dramático seria evidenciado pela emissão radiofónica de Orson Welles em 1938, que sobressaltou dezenas de milhares de norte-americanos. E tem sido atualizado nos nossos dias pela descoberta de numerosos planetas no universo, e mesmo na Via Láctea, com condições para a existência de vida.


A Guerra dos Mundos (trad. Frederico Pedreira) e outras obras de H. G. Wells estão disponíveis em https://relogiodagua.pt/autor/h-g-wells/

Maria Filomena Mónica em entrevista ao Diário de Notícias





«João Céu e Silva — O olhar dos visitantes sobre Portugal vai mudando ao longo dos séculos ou a opinião que têm mantém um padrão semelhante?
Maria Filomena Mónica — O olhar dos que nos visitaram muda não só devido às circunstâncias com que se depararam mas devido às ideias que traziam na cabeça e que se vão alterando com a passagem dos anos.

João Céu e Silva — A escolha dos visitantes obedeceu a um critério de qualidade de observação ou resulta dos mais interessantes de uma lista dos que nos visitaram ao longo de séculos?
Maria Filomena Mónica — A minha seleção obedeceu a vários critérios, de que o mais importante era eu poder dispor de obras biográficas sobre quem nos visitara. Isto porque desejava saber o que condicionaria o seu “olhar".
Há um conjunto de referências comuns entre todos os visitantes ou alguns são mais perspicazes?
Alguns são mais perspicazes do que outros. No que respeita à primeira metade do século XIX, o mais inteligente é Lord Porchester, a mais doce é Dora Wordsworth Quillinan, filha do famoso poeta do Lake District e, para uma época mais recente, a lúcida Mary McCarthy.» [Diário de Notícias, 21/3/2020, https://tinyurl.com/y8qurga8 ]


Esta e outras obras de Maria Filomena Mónica estão disponíveis em https://relogiodagua.pt/autor/maria-filomena-monica/

José Gil em entrevista à Rádio Renascença




«— Para concluir, qual é nesta altura o seu maior receio, a sua angústia mais marcante?


— O que lhe vou dizer pode até parecer abstrato. O meu maior receio é de tal maneira que nem consigo pensá-lo bem; talvez ninguém consiga fazê-lo. É que, de repente, haja uma conjunção factual nos acontecimentos da crise pandémica — que não vai acabar já — com a crise ecológica e com a recessão económica. Se estas três crises se conjugam e se entram em colisão — e teríamos que analisar cada uma delas — não sei o que isto poderá dar. Este é o meu receio maior. Mas tenho um segundo receio, que tem a ver com o primeiro; é que, infelizmente, repito infelizmente, não vejo nada do lado dos responsáveis políticos dos diferentes estados que possa manifestar um desejo de mudança real. Eles não nos dizem nada, não há programa nenhum, apenas dólares e euros, é tudo quanto sabem pensar. Isso provoca-me uma profunda amargura e receio e acho que milhões de pessoas também pensam assim.» [Entrevista de José Gil a Luís Aresta, RR, 24/4/20. Disponível aqui.]

Obras de José Gil disponíveis em https://relogiodagua.pt/autor/jose-gil/

Sobre O Planeta do Sr. Sammler, de Saul Bellow




Artur Sammler é um sobrevivente do Holocausto. Atormentado pelas memórias da sua quase morte, passa agora os dias em Nova Iorque. Um intelectual que outrora estudara as grandes obras da literatura e filosofia ocidentais, lecciona agora ocasionalmente na Universidade de Columbia. Um «escrivão da loucura» que relata a degradação da vida citadina, debruçando-se também sobre os sofrimentos da alma humana. Enquanto o mundo está ocupado com a primeira aterragem na Lua e visões utópicas rivalizam com um eminente apocalipse da terra, Sammler encontra-se intrigado com as possibilidades que o futuro reserva aos que, como ele, são mortais. Na sua essência, o romance é bellowiano: moral, urbano, intrinsecamente humano.


O Planeta do Sr. Sammler (tradução de José Miguel Silva) e outras obras de Saul Bellow estão disponíveis em https://relogiodagua.pt/autor/saul-bellow/

A Relógio D’Água recomenda: A Mão Esquerda das Trevas, de Ursula K. Le Guin





Considerada uma obra maior da ficção científica, A Mão Esquerda das Trevas conta a história de um viajante solitário terrestre, enviado em missão para Inverno.
O objetivo da missão é permitir que Inverno seja incluído numa civilização galáctica. Os seus dois regimes políticos mais importantes são uma monarquia governada por um rei extravagante e um regime comunal, dirigido por uma burocracia minuciosa e racionalista.
Mas o mais estranho para o enviado terrestre é a particular androginia dos habitantes, que apenas numa dada fase assumem uma forma inteiramente feminina ou masculina, podendo ao mesmo tempo ser mães de umas crianças e pais de outras.
Este contacto com um modo de pensar diferente e as suas consequências nas relações pessoais e sociais permite alargar a compreensão da nossa própria realidade.

«Le Guin, mais do que Tolkien, elevou a fantasia à alta literatura, para o nosso tempo.» [Harold Bloom]

A Mão Esquerda das Trevas, com tradução de Fátima Andrade, está disponível aqui: https://relogiodagua.pt/produto/a-mao-esquerda-das-trevas/

Sobre As Variedades da Experiência Religiosa, de William James




Em As Variedades da Experiência Religiosa, William James aplica o método científico aos fenómenos religiosos, abordando o misticismo e a religião através do pragmatismo e da psicologia experimental.
O livro, nascido das Conferências Gifford apresentadas na Universidade de Aberdeen a partir da primavera de 1901, coloca o acento no estudo das formas exteriores de religião e nos estados mentais a elas associados.
Para ilustrar as suas teorias, William James cita as suas próprias experiências, as dos seus próximos, e também pensadores como Voltaire, Whitman, Emerson, Lutero, Tolstoi, John Bunyan e Jonathan Edwards.
Este ensaio, de um psicólogo que se tornou filósofo, é de uma extrema atualidade num tempo marcado pela afirmação das religiões e pelos seus conflitos.

As Variedades da Experiência Religiosa, de William James (trad. de Helena Briga Nogueira e Margarida Periquito), está disponível em https://relogiodagua.pt/produto/as-variedades-da-experiencia-religiosa/

26.4.20

Filipe Melo recomenda a leitura de Karen, de Ana Teresa Pereira



A propósito do Dia Mundial do Livro, Filipe Melo sugeriu aos leitores da FNAC vários livros, entre eles Karen, de Ana Teresa Pereira.

«Le Notti Bianche passava-se numa ponte: Maria Schell esperava o amante que partira há um ano, Marcello Mastroianni apaixonava-se por ela, e havia música, não sei de onde vinha a música, talvez de um bar ou de uma esplanada próxima; lembro-me de um barco no canal, e dos sinos a tocarem, e do momento em que começava a nevar, e da rapariga a deixar cair o casaco que tinha sobre os ombros e a correr para os braços de um dos homens. Black Narcissus: Deborah Kerr vestida de freira, e o inesperado dos seus cabelos ruivos quando recordava, porque aquele lugar fazia recordar coisas; Kathleen Byron a tocar o sino do mosteiro na beira do precipício e a pintar os lábios na sua cela, a voltar de madrugada com um vestido vermelho e o cabelo molhado; e depois a luta final entre a jovem com o hábito branco e a jovem com o vestido vermelho, as nuvens lá em baixo, o mosteiro erguia-se acima das nuvens.
Em tempos pensava que todas as histórias eram uma só, a luta entre o anjo bom e o anjo caído, e sempre à beira de um abismo.»

Esta obra e outras obras de Ana Teresa Pereira estão disponíveis em

Sobre Céu em Fogo, de Mário de Sá-Carneiro




«Oscilando entre a angústia da fugacidade do tempo e a tragédia da repetição, as personagens de Céu em Fogo abismam-se fatalmente no tédio e, numa luta penosa — que é também um confronto fascinado com a morte —, tentam inventar maneiras de o vencer. É esta a tarefa fantástica que vai empreender o Fixador de Instantes. Tomado por um «tédio mortal» no momento em que constata a inevitabilidade da sua morte, acaba por realizar no crime a sua obsessão de posse total. Também na novela «A Grande Sombra», que diríamos o diário de um psicopata dos tempos modernos, o protagonista renasce «outra vida» após o assassínio violento de uma rapariga que acaba de conhecer, com quem se envolve sexualmente. Este crime acorda-o da sonolência monótona em que vivia até aí, e tem o efeito imediato de «parar os instantes», de suspender o tempo, e, paralelamente, eliminar a angústia da morte que o vinha deprimindo. O suicídio final, para o qual se encaminha em euforia louca, está para além do remorso: é o culminar triunfal da sua busca do mistério e do desconhecido.
O crime e o suicídio, tão presentes nestas novelas, são as duas faces da mesma moeda, aquela com que ilusoriamente se quer pagar o preço da modernidade, na sua paixão pelo Novo: a morte é a única região inexplorada, não há novidade senão na morte. Para estes heróis de tragédia moderna, o suicídio não é um puro acto de desespero, mas a única forma de heroísmo, a última procura que vale a pena — um acto estético, ou uma deserção.» [Do Prefácio de Maria Antónia Oliveira]


Céu em Fogo e outras obras de Mário de Sá-Carneiro estão disponíveis em https://relogiodagua.pt/autor/mario-de-sa-carneiro/

Nuno Markl recomenda a leitura de Uma Conspiração de Estúpidos, de John Kennedy Toole




A propósito do Dia Mundial do Livro, Nuno Markl sugeriu aos leitores da FNAC vários livros, entre eles Uma Conspiração de Estúpidos, de John Kennedy Toole.

O protagonista deste romance é uma das personagens mais memoráveis da literatura norte-americana.
Aos 30 anos, Ignatius J. Reilly vive com a mãe, ocupado a escrever uma demolidora denúncia do século XX, uma perturbante alegação contra uma sociedade perturbada. Devido a uma inesperada necessidade de dinheiro, vê-se catapultado para a febre da existência contemporânea, febre que, por sua vez, contribui para aumentar em alguns graus.


25.4.20

Sobre Alexandra Alpha, de José Cardoso Pires




«Com uma escrita de apuro, Cardoso Pires traça um ambiente turvo. Com uma escrita áspera, Cardoso Pires retrata pessoas indolentes. Com uma escrita exacta, Cardoso Pires assenta diálogos derivativos, enrolados, incongruentes — e essa coisa é que é linda. (…)
Nunca antes, na nossa literatura, o dia 25 de Abril foi descrito de forma tão vibrante e tão vivida (…).
Este é um livro para ser lido de lanterna na mão. Ou, então, com uma daquelas luzes de mineiro que estes usam no capacete para descer às profundezas. É de escuridão e de bas-fond lisboeta que se trata. De uma certa vida boémia que já não existe — ou já não será exactamente assim. É um livro noctívago, este. Cheio de velhos lobos-de-bares. “Bares dialécticos com meninas à Godard”, outros “com máquinas de discos aos coices”.
Em torno de Alexandra, a publicitária, a mulher do corpo desmemoriado, cuja mais interessante característica é não prestar contas a ninguém, enxameiam as mais bizarras personagens.» [Do Prefácio]


Alexandra Alpha e outras obras de José Cardoso Pires estão disponíveis em https://relogiodagua.pt/autor/jose-cardoso-pires/

Ricardo Araújo Pereira recomenda livros de Gonçalo M. Tavares e Tchékhov



Ricardo Araújo Pereira recomenda a leitura de Eliete, Atlas do Corpo e da Imaginação, Contos de Tchékhov e Vida de D. Frei Bartolomeu dos Mártires



A propósito do Dia Mundial do Livro, Ricardo Araújo Pereira sugeriu aos leitores da FNAC quatro livros, dois deles publicados pela Relógio D’Água: Atlas do Corpo e da Imaginação, de Gonçalo M. Tavares, e Contos — Volume I, de Tchékhov.




Estas e outras obras de Gonçalo M. Tavares e de Anton Tchékhov estão disponíveis em https://relogiodagua.pt

24.4.20

Sobre Uma Mulher Perdida, de Willa Cather




«Willa Cather foi uma das maiores romancistas americanas da primeira metade do século XX, equiparável a Theodore Dreiser, Ernest Hemingway e F. Scott Fitzgerald. (…) O seu génio, a meu ver, emerge mais claramente em dois pequenos romances líricos, Minha Ántonia (1918) e Uma Mulher Perdida (1923).» [Harold Bloom, «Génio»]


Uma Mulher Perdida (trad. Paulo Faria) e outras obras de Willa Cather estão disponíveis em https://relogiodagua.pt/autor/willa-cather/

Paolo Giordano em entrevista ao Expresso, a propósito do livro Frente ao Contágio




«[Cristina Margato — ] O que descobrimos depois de tomar essas medidas é que podemos ser todos iguais aos olhos do vírus, mas não somos todos iguais enquanto berlindes paralisados, fora de jogo. Perante as regras de distanciamento e isolamento, somos todos diferentes: [Paolo Giordano — ]“O meu confinamento é diferente do confinamento de outras pessoas com apartamentos mais pequenos, sem varandas, jardins ou janelas, ou das pessoas que têm filhos muito pequenos ou familiares com problemas mentais, dependências e vícios. A desigualdade já estava lá. Nós sabíamos que ela existia. Mas não era tão visível quanto é agora. De algum modo, estamos a ver de forma muito brutal todas as coisas que deixámos por resolver ao longo dos anos. Então, o vírus coloca à vista as discrepâncias da nossa sociedade, fazendo-as emergir de uma forma muito forte.”» [Expresso, E, 18/4/2020, https://tinyurl.com/ybnk5p8y , fotografia de Paolo Giordano: Leonardo Cendamo/Getty Images]




Frente ao Contágio e outras obras de Paolo Giordano estão disponíveis em https://relogiodagua.pt/autor/paolo-giordano/

Sobre Mary Poppins, de P. L. Travers




«Ora, meninos», disse a Sra. Banks, reparando subitamente nos filhos, «que fazem aqui? Esta é a Mary Poppins, a vossa nova ama. Jane e Michael, digam olá à senhora.»

Jane e Michael não gostavam da sua antiga ama. Também não tinham a certeza de ir gostar da nova: Mary Poppins.
Rapidamente mudaram de ideias quando a viram deslizar pelo corrimão acima – e retirar de seguida várias coisas empolgantes de um saco de alcatifa completamente vazio.
Agora a única preocupação deles é que ela não parta, pois Mary Poppins apenas prometeu ficar «até que os ventos mudem de direção».

«Mary Poppins é a Boa Fada que todos procuramos.»
[Times Literary Supplement]


Mary Poppins e O Regresso de Mary Poppins estão disponíveis em https://relogiodagua.pt/autor/p-l-travers/

Sobre Bem Está o que Bem Acaba, de William Shakespeare




«A generalidade dos estudiosos concorda que a fonte principal de inspiração de Shakespeare para Bem Está O Que Bem Acaba foi a história de Giletta di Narbona, que constitui a nona novela do Terceiro Dia do Decameron, da autoria do italiano Giovanni Boccaccio (1313-1375). É improvável que o dramaturgo inglês tenha lido essa história no original italiano, e, por isso, têm sido aventadas duas hipóteses sobre o texto a que ele terá tido acesso: uns entendem que Shakespeare leu a história numa versão inglesa publicada em The Palace of Pleasure de William Painter (1540?-1594), cujo primeiro volume veio a público em 1566; outros defendem que o seu contacto com a história de Giletta lhe foi proporcionado pela leitura da versão francesa — é sabido que Shakespeare tinha alguns conhecimentos de francês —, da responsabilidade de Antoine le Maçon, publicada em Paris em 1584. G. K. Hunter, na excelente introdução à sua edição de All’s Well That Ends Well, desenvolve esta questão com alguma profundidade, apresentando alguns dos argumentos que têm sido invocados, quer a favor da hipótese Painter quer da hipótese Le Maçon, mas não se decide por qualquer delas. (…) 
O que Shakespeare foi capaz de fazer melhor do que ninguém foi levar-nos a reflectir — através dos comportamentos das personagens que adoptou e da forma como aproveitou histórias conhecidas — sobre a vida, o homem (com as suas virtudes e os seus defeitos), a natureza, a religião, etc., através da utilização de uma linguagem inovadora e incomparavelmente vigorosa, criativa e poética.» [Da Introdução de M. Gomes da Torre]


Bem Está o que Bem Acaba (tradução, introdução e notas de M. Gomes da Torre) e outras obras de William Shakespeare estão disponíveis em https://relogiodagua.pt/autor/william-shakespeare/

23.4.20

Sobre O Mendel dos Livros e Viagem ao Passado, de Stefan Zweig




Escrito em 1929, O Mendel dos Livros narra a história de um espantoso alfarrabista que passa os dias sentado na mesma mesa de um dos cafés de Viena.
Com a sua memória enciclopédica e a generosa disponibilidade, este judeu russo é admirado pelo dono do café Gluck e pela clientela culta que recorre aos seus serviços. No entanto, em 1915, em plena Primeira Guerra Mundial, quando o Império Austro-Húngaro e a Rússia se encontravam em campos opostos, Jakob Mendel é enviado para um campo de prisioneiros, injustamente acusado de colaborar com os inimigos da Áustria.
A Viagem ao Passado mostra-nos como uma relação amorosa pode ser interrompida e até desfeita pelas contingências da guerra, um tema que Zweig abordou sob diversas formas. 


Esta e outras obras de Stefan Zweig estão disponíveis em https://relogiodagua.pt/autor/stefan-zweig/

Ben Lerner vence L. A. Times Book Prize com The Topeka School





Ben Lerner é o vencedor do L. A. Times Book Prize na categoria de ficção com «The Topeka School». A propósito da atribuição do prémio, o L. A. Times entrevistou o autor, cujo romance será editado em Portugal pela Relógio D’Água, com tradução de Alda Rodrigues.

«— O poema clássico de Gelett Burgess “The Purple Cow”, que surge em “The Topeka School”, parece estranhamente perfeito para o mundo bizarro em que vivemos hoje. (…)

— O poema é verdadeiramente importante no romance. (…) Um poema absurdo torna-se realmente importante para eles, cheio de significados que de outro modo não poderiam exprimir. Um poema pode ser um local de encontro em que descobrimos e criamos e partilhamos significado e observamos esses significados em mudança e multiplicação.» [Ben Lerner em entrevista a Nathan Deuel, L. A. Times, 17/4/2020. Disponível em https://www.latimes.com/entertainment-arts/books/story/2020-04-17/ben-lerner-the-times-book-prize-fiction-winner-on-how-language-can-destroy-or-rebuild

Sobre Dez Razões (Possíveis) para a Tristeza do Pensamento, de George Steiner




«Schelling, entre outros, atribui à existência humana uma tristeza fundamental, inescapável. Mais particularmente, esta tristeza oferece o fundamento sombrio sobre o qual assentam a consciência e a cognição. Este fundamento sombrio deve, na verdade, ser a base de toda a perceção, de todo o processo mental. O pensamento é rigorosamente inseparável de uma “melancolia profunda e indestrutível”. A cosmologia atual oferece uma analogia à crença de Schelling. Aquela do “ruído de fundo”, dos comprimentos de onda cósmica, esquivos mas inescapáveis, que são os vestígios do Big Bang, do surgimento do ser.»


Dez Razões (Possíveis) para a Tristeza do Pensamento (trad. Ana Matoso) e outras obras de George Steiner estão disponíveis em https://relogiodagua.pt/autor/george-steiner/

Sobre D. Quixote de la Mancha, de Miguel de Cervantes




“Dom Quixote, Falstaff e Emma Bovary representam essas descobertas da consciência; criando-os, na iluminação recíproca do acto criador e do crescimento da coisa criada, Cervantes, Shakespeare e Flaubert chegaram literalmente a conhecer “partes” de si próprios antes insuspeitadas.” [George Steiner]

“Não queria compor outro Quixote — o que é fácil —, mas “o” Quixote. Não vale a pena acrescentar que nunca encarou a possibilidade de uma transcrição mecânica do original; não se propunha copiá-lo. A sua admirável ambição era produzir umas páginas que coincidissem — palavra por palavra e linha por linha — com as de Miguel de Cervantes.”
[Jorge Luis Borges, “Pierre Menard, autor do Quixote”]


D. Quixote de la Mancha (trad. e notas de José Bento ) está disponível em https://relogiodagua.pt/produto/d-quixote-de-la-mancha/

22.4.20

Maria Filomena Mónica em entrevista ao Sol, a propósito do seu mais recente livro, O Olhar do Outro




«De Baretti e William Beckford a Simone de Beauvoir e García Márquez, a socióloga recolheu as impressões anotadas por aristocratas, cientistas, comerciantes e escritores que nos visitaram ao longo destes mais de 200 anos. A essa recolha juntou biografias dos autores destas palavras, que ajudam a compreender o quadro mental de cada um e os respetivos preconceitos. “Gostei muito de escrever este livro”, diz-nos Maria Filomena Mónica. Mesmo se o retrato geral do país que resulta destes testemunhos deixe, as mais das vezes, um travo amargo. […]

José Cabrita Saraiva — Acha que as opiniões de figuras como Baretti, Carrère, Beckford, Byron, Lichnowsky, Porchester, etc., são justas ou foram distorcidas pelo preconceito? Estou a pensar, por exemplo, nesta de J. B. F. Carrère, antigo conselheiro médico do Rei Luís XVI de França, em que aconselha o português a viajar, para concluir: “Envergonhar-te-ás de ter nascido português […] e concordarás então que o teu país é o mais atrasado, o mais ignorante, o menos civilizado, o mais selvagem e bárbaro de todos os países da Europa”.

Maria Filomena Mónica — Foram muitas vezes deturpadas. Nomeadamente, no caso dos ingleses. Não só por a Inglaterra ser, no séc. XIX, o país mais desenvolvido da Europa, mas por virem da boca de quem perfilhava uma religião diferente, a anglicana. Este último fator foi determinante, pois contribuiu para atribuir os defeitos portugueses à religião católica. Portugal tinha múltiplos fatores — a situação geográfica, a ausência de carvão, solos fracos — que explicam o seu atraso. A Igreja Católica poderá ter contribuído para o atraso, mas “a lenda negra” é um preconceito dos países do norte quando olham para o sul.» [Sol, 10/4/2020]


Esta e outras obras de Maria Filomena Mónica estão disponíveis em https://relogiodagua.pt/autor/maria-filomena-monica/

Sobre Um Sopro de Vida, de Clarice Lispector




«Isto não é um lamento, é um grito de ave de rapina. Irisada e intranquila. O beijo no rosto morto.
Eu escrevo como se fosse para salvar a vida de alguém. Provavelmente a minha própria vida. Viver é uma espécie de loucura que a morte faz. Vivam os mortos porque neles vivemos.
De repente as coisas não precisam mais fazer sentido. Satisfaço-me em ser. Tu és? Tenho certeza que sim. O não sentido das coisas me faz ter um sorriso de complacência. De certo tudo deve estar sendo o que é.»

Neste livro inclassificável, Clarice imagina uma personagem, Ângela Pralini, através da qual entra em conflito consigo mesma para se distanciar de si e evitar o pior dos plágios.
João Cezar de Castro Rocha afirma, na edição brasileira, que os livros de Clarice «se transformam sempre num mergulho no infinito de uma identidade à deriva».
Isso é particularmente válido para Um Sopro de Vida, publicado em 1978. A sua actualidade levou Pedro Almodóvar a escrever, em carta a Benjamin Moser, biógrafo de Clarice Lispector:
«O romance é recheado de frases memoráveis sobre a criação literária e a passagem do tempo, o desespero e a multiplicidade humana, incluindo a necessidade de se falar de si mesmo, a procura por um interlocutor e o facto de se encontrar isso dentro de si mesmo. Quero citar frases dela na edição em livro do argumento de A Pele Que Habito


Um Sopro de Vida e outras obras de Clarice Lispector estão disponíveis em https://relogiodagua.pt/autor/clarice-lispector/

Nelson Nunes sugere a leitura de Gonçalo M. Tavares e Oliver Sacks



Na rubrica Livros para a Quarentena, no site Eu Leio em Casa, Nelson Nunes sugere a leitura de Atlas do Corpo e da Imaginação, de Gonçalo M. Tavares, de Musicofilia, de Oliver Sacks.



«O Atlas do Corpo e da Imaginação é a sua obra maior. É uma enciclopédia sobre o que somos e quem somos, com os outros e connosco próprios, numa exploração diametral que vai da função dos dedos ou dos olhos à nossa necessidade de ter leis e fazer política.
Este, como todos os outros na vastíssima bibliografia de GMT, é algo nunca antes visto na literatura. Inventivo como pouquíssimos.»



«“O pai espirra em dó menor.” Foi este o caso que mais me surpreendeu neste livro: uma criança hipersensível à música que conhecia as notas só de as escutar. Musicofilia, de Oliver Sacks, é um compêndio de casos de pessoas que têm uma estranha relação neurológica com a música, com tanto de bizarro quanto de fascinante.
E, se já leram esta obra, podem escolher, à confiança, qualquer outra da bibliografia de Sacks, porque o cavalheiro era um virtuoso da escrita, e qualquer livro seu é garantidamente um mergulho incomparável na mente humana.»

Todas as sugestões podem ser consultadas aqui: https://euleioemcasa.pt/livros-para-a-quarentena-2-por-nelson-nunes/

Atlas do Corpo e da Imaginação e outras obras de Gonçalo M. Tavares estão disponíveis em https://relogiodagua.pt/autor/goncalo-m-tavares/

Musicofilia e outras obras de Oliver Sacks estão disponíveis em https://relogiodagua.pt/autor/oliver-sacks/

Sobre Fala, Memória, de Vladimir Nabokov




Nabokov foi um dos raros escritores exilados pela Revolução de Outubro de 1917 que preservou na memória da Rússia da sua infância como paraíso perdido a que nunca quis regressar.
A sua obra não é, pois, um ajuste de contas com os acontecimentos que destruíram as paisagens da sua infância e juventude.
Fala, Memória é um dos mais deslumbrantes livros que alguém escreveu sobre o seu passado. Talvez porque, para Nabokov, mais importante do que a política ou a vida usual, era a arte sob a forma da escrita, o amor, o voo colorido das borboletas, a recusa da vulgaridade e os problemas de xadrez.

«O presente trabalho colecciona recordações pessoais sistematicamente correlacionadas, que em termos geográficos se estendem de São Petersburgo a Saint-Nazaire e abrangem trinta e sete anos, de Agosto de 1903 a Maio de 1940, com incursões várias a um espaço-tempo posterior.» [Do Prefácio de Vladimir Nabokov]


Fala, Memória — Uma Autobiografia Revisitada (trad. Aníbal Fernandes) e outras obras de Vladimir Nabokov estão disponíveis em https://relogiodagua.pt/autor/vladimir-nabokov/