30.11.18

António Lobo Antunes e Gonçalo M.Tavares ultrapassaram Fernando Pessoa




Já não são só as obras de Pessoa que os mexicanos procuram. Na livraria do pavilhão de Portugal, o país convidado da Feira do Livro de Guadalajara, as expectativas foram superadas logo nos primeiros dias. E a enchente de público ainda está para chegar.
Há milhares de livros à venda e a livraria do pavilhão de Portugal tem suscitado a curiosidade dos mexicanos, que procuram não só livros traduzidos como livros escritos em português.
Só nos primeiros dias, venderam-se mais de 1.500 livros. Alguns títulos já esgotaram e os mexicanos têm estado a descobrir novos nomes da literatura portuguesa. Na livraria que ocupa o coração do pavilhão de Portugal, a procura excedeu a expectativas, diz a comissária Manuela Júdice. Em entrevista à Renascença, a responsável revela que a presença de autores como António Lobo Antunes e Gonçalo M. Tavares já teve efeitos diretos nas vendas. 
“Os autores mais vendidos são: em primeiro lugar, António Lobo Antunes, segundo Gonçalo M. Tavares e em terceiro lugar Fernando Pessoa. Antes da feira começar, só se falava de Fernando Pessoa”, explica Manuela Júdice. As bibliotecas dos mexicanos descobrem, assim, outros nomes e essa procura coincidiu com a presença na feira dos autores de “O Manual dos Inquisidores” e “Jerusalém”.
Contudo, a procura não é só por obras traduzidas. Os livros escritos em português também têm tido uma procura que surpreende a organização portuguesa. “Não calculamos, nem nós nem os mexicanos”, indica Manuela Júdice.
A comissária da representação nacional explica que foram surpreendidos pela procura por parte das escolas privadas. “Chegam aqui professores de Português em escolas privadas e compram aos 15 livros para as bibliotecas. Superou a expectativa”, concretiza.
Até domingo, espera-se a maior enchente de pública nesta feira organizada há 32 anos e que, no ano passado, contabilizou 800 mil visitantes. O responsável da Direcção Geral do Livro, Arquivos e da Biblioteca, José Manuel Cortez, diz que os dias de “sábado e domingo podem alterar o que se está a prever de vendas.” 
Além dos livros, os leitores mexicanos levam também para casa marcadores com autógrafos de escritores portugueses.
A Feira de Guadalajara termina no domingo com a presença do primeiro-ministro, António Costa, que irá encerrar o certame e passar o testemunho à Índia, próximo país convidado. 

[A partir do artigo de Maria João Costa, em Guadalajara, RR, 29/11/18]

29.11.18

A chegar às livrarias: Arte e Infinitude de Bernardo Pinto de Almeida





Este ensaio desenvolve, até ao campo que, não sem equívocos, se designa por Contemporaneidade, a investigação começada pelo autor com o livro O Plano de Imagem (1996), cujo propósito foi elaborar uma “arqueologia da modernidade”.
Parte-se de uma concepção antiformalista do Modernismo, que permite reinterpretar criticamente os legados de Picasso, Duchamp ou Malévich, bem como o lugar de alguns artistas e movimentos europeus da década de 60 — Pop inglesa, Beuys, Arte Povera —, para evidenciar o que os diferencia ou opõe ao contexto da arte americana no mesmo período (Warhol, Minimalismo, Arte Conceptual).

«A esta luz, procuraremos pensar em que medida a Contemporaneidade, enquanto tempo de todos os tempos por ser o tempo de todas as imagens, se constituiu precisamente graças ao aflorar de uma nova dialéctica.
A que coloca face a face o domínio aberto pelo tecnológico e o retorno incessante do arcaico (da arkhé), precisamente pelo facto de terem sido instaurados, um e outro, pela irrupção, graças ao fotográfico, do novo tempo das imagens: este nosso tempo.» [Da Introdução]


Esta obra, que é uma co-edição entre a Fundação de Serralves e a Relógio D’Água, resulta do desenvolvimento das conferências proferidas pelo autor na Fundação de Serralves entre Novembro de 2017 e Março de 2018, designadas Arte e Infinitude.

Sobre Os Últimos Escritos, de Lev Tolstoi




«Além de uma selecção de cartas e diários, reúnem-se aqui reflexões que Tolstói fez nos anos que antecederam a sua morte a 20 de Novembro de 1910 na estação de Astapovo. É, em particular, evidente a preocupação do autor de Anna Karénina com as questões religiosas, a arte, o amor, a educação, a violência, a paz e a morte. A sua relação crítica com os poderes religiosos surge em Resposta ao édito do Sínodo sobre a excomunhão e às cartas que recebi a esse respeito, nos fragmentos de O que é a religião e em que consiste a sua essência? e em Apelo ao clero. O seu conflito com Shakespeare é expresso em Shakespeare e o drama. Outras questões essenciais são abordadas em O trabalho, a morte e a doença e A lei do amor e a lei da violência.» [no blogue literário da Bertrand, «Somos Livros», sobre «6 livros essenciais de Tolstói», 20/11/18]

A chegar às livrarias: «Lisboa, Livro de Bordo», de José Cardoso Pires




“Lisboa é uma cidade de que é fácil gostar. Não recusa nenhum acrescento, absorve-o. ‘Mesmo os aleijões’, dizia Cardoso Pires em entrevista filmada no Jardim do Torel, de câmara assestada à linha do horizonte, de recorte pregueado de telhados subitamente rompido pelo espinho das Torres das Amoreiras. (…) 
Passados 20 anos, a Relógio D’Água reformula o aspecto e o uso do texto. Com razão: continua vigoroso o discorrer, em tons de amor-ódio, sobre a vivência do espaço ancestral; mas a cidade de Cardoso Pires vai-se tornando mais rara de encontrar. Coube à fotografia de José Carlos Nascimento — com vasta utilização da urbe em vários trabalhos — recuperar o que do texto persiste visualmente, para apoio a uma leitura mais referenciável dos novos apaixonados de Lisboa.” [Do Prefácio de Ana Cardoso Pires]

28.11.18

Sobre Ressurreição, de Lev Tolstoi




«Numa nova edição publicada pela Relógio D’Água, Ressurreição é o último dos grandes romances de Lev Tolstói. Conta-nos a história de um príncipe russo, Dmítri Nekhliúdov e de uma jovem empregada doméstica, Máslova, que ele seduziu no passado, com consequências dramáticas para esta, que acaba por cair na prostituição, por ser acusada de um crime que não cometeu e por ser enviada como prisioneira para a Sibéria. Tolstói constrói aqui uma narrativa de grande intensidade psicológica, dominada pela visão que tem da redenção e do perdão inerentes ao amor, que é ao mesmo tempo uma descrição panorâmica e incisiva da vida social da Rússia czarista de finais do século XIX e uma crítica sarcástica às injustiças sociais, ao sistema judicial e ao regime russo.» [no blogue literário da Bertrand, «Somos Livros», sobre «6 livros essenciais de Tolstói», 20/11/18]

Sobre Um Cântico de Natal, de Charles Dickens




Um Cântico de Natal (1843) é talvez o mais dickensiano dos contos. 
É que só Charles Dickens poderia, a propósito do Natal, criar personagens como Scrooge, o pequeno Tim, e os três Espíritos Natalícios, Passado, Presente e Futuro, e acrescentar-lhes o Fantasma de Marley.
Este livro tem passado de geração em geração, acompanhado do desejo do autor de que «assombre as casas dos leitores de forma agradável, e que ninguém deseje apaziguá-lo».

27.11.18

Conflito Interno, de Kamila Shamsie, vence London Hellenic Prize





Foi ontem atribuído a Kamila Shamsie, por Conflito Interno, o London Hellenic Prize, que distingue obras escritas (ou traduzidas) em inglês sobre assuntos relacionados com a cultura grega.
Conflito Interno retoma o tema da tragédia grega Antígona, de Sófocles, para contar a história de uma família muçulmana britânica.
Os outros finalistas do prémio foram: Josephine Balmer, com The Paths of Survival; Daniel Mendelsohn, com An Odyssey: a Father, a Son and an Epic; Yopie Prins, com Ladies’ Greek: Victorian Translations of Tragedy; Colm Tóibín, com House of Names; David Vann, com Bright Air Black; e Emily Wilson, com a tradução de Odisseia.
Kamila Shamsie venceu também o Women’s Prize for Fiction com o romance Conflito Interno, que já antes fora nomeado para o Man Booker Prize e para o Costa Book Award.

Isma está livre. Criou os seus irmãos gémeos após a morte da mãe e agora pode regressar ao sonho que há muito interrompera — estudar na América. Mas não consegue deixar de se preocupar com Aneeka, a bela e obstinada irmã que vive em Londres. Ou com Parvaiz, o irmão que desapareceu em busca do próprio sonho — provar a si mesmo que é herdeiro do legado jihadista do pai que nunca conheceu.
Depois Eamonn entra na vida das irmãs. Bem-parecido e privilegiado, vive em Londres, num mundo diferente. Filho de um poderoso político muçulmano britânico, Eamonn tem um legado a defender — ou a desafiar.
O destino das duas famílias está inextricavelmente ligado.
Conflito Interno é uma história sobre lealdades que não resistem à colisão entre amor e política e confirma Kamila Shamsie como uma grande escritora dos nossos tempos.

Sobre Suíte e Fúria, de Rui Nunes




«Estamos, aliás, perante um tríptico composto por uma narrativa sincopada e duas partes em que “poemas” e “anotações filosóficas” saudavelmente se tornam distintos, na esteira dos chamados “pré-socráticos”: “A vida é um fragmento”; “quando mais se escreve, mais falta”. Ao longo destas páginas duras e inclementes, trava-se uma luta com a perfeição: “A imperfeição revela a intimidade de um texto. A aspereza da sua luz.”  E talvez nunca tenha sido tão necessário denunciar uma certa beleza assética e os mecanismos de uma dissecação inerentes: “Merda para a beleza. Merda para os poemas bem escritos. Merda para os que dissecam o cadáver de um livro. Merda para isto tudo.” Contudo, a elegia acaba por se sobrepor à raiva, até porque “cada palavra escrita é a eternidade à espera da morte”.» [Manuel de Freitas, Expresso, E, 10/11/2018]

26.11.18

Sobre As Estações da Vida, de Agustina Bessa-Luís




«Agora, num regresso a Lisboa, vou de comboio e leio um livrinho de Agustina Bessa-Luís sobre comboios, texto breve onde a viagem de comboio é definida, justamente, como “um processo romanesco”, um primeiro capítulo e uma história que se desconhece.
Para Agustina, o comboio equivale à província, ou à sua memória da província: os caixeiros-viajantes, os padres, os estudantes em férias, os contrabandistas, caçadores com os cães, almas snobes, almas sensatas, almas festivas, pessoas que lêem as “Décadas” de João de Barros ou comem requeijão, gente no tejadilho até, como nas imagens da Índia que todos já vimos. E o delegado do Ministério Público que vê passar o Sud-Express e não sabe se há-de ir para Condeixa ou para o Cairo.
Teoricamente, o livro de Agustina é sobre os painéis de azulejos das estações de caminho-de-ferro, essa “poesia pobre” mas significativa, mas a escritora, como é seu timbre, afasta-se do tema e investiga os comboios, mais do que os azulejos. O que é um comboio? Às vezes um fascínio tranquilo, outras uma aventura imaginativa, outras uma melancolia da separação e do inatingível. E vêm à ideia as imagens dos comboios que observava ao longe, comboios-correio, comboios de mercadorias, comboios da noite com as suas “luzes remotas e fugidias”. Mas um comboio, além de uma recordação, é também uma mitologia. Uma mitologia civilizacional e, lembra Agustina, libidinal.

Há uma clima de melodrama nos comboios, Anna Karénina atira-se para debaixo de uma locomotiva, porque o comboio é não apenas um epílogo da sua desgraça mas a continuação da sua ventura, o comboio como “viagem, fuga, fadiga sob um ângulo de distracção e esquecimento”.» [Pedro Mexia, E, Expresso, 24/11/2018]

As Aventuras de Pinóquio, de Carlo Collodi




Esta é a história do boneco de madeira que desejou tornar-se rapaz. Tudo começa quando o desprevenido Gepeto esculpe um pedaço de madeira que consegue andar e falar. Assim nasce Pinóquio, que, depois de causar vários problemas a Gepeto, vive inúmeras aventuras, no decurso das quais é perseguido pela Raposa e pelo Gato, aconselhado pelo Grilo-Falante e salvo por uma linda Menina de cabelos azul-turquesa. Além disso, o nariz cresce-lhe quando conta uma mentira. Como se isso não bastasse, é transformado num burro e engolido por um tubarão, antes de alcançar a felicidade.

23.11.18

Lançamento de Arte e Infinitude de Bernardo Pinto de Almeida na Livraria de Serralves




O livro Arte e Infinitude, de Bernardo Pinto de Almeida, vai ser apresentado na Livraria de Serralves, na Rua D. João de Castro, n.º 210, no Porto, no dia 28 de Novembro, quarta-feira, às 18h00.
A apresentação será feita pelo Professor Bragança de Miranda, em conversa com o Autor.

Esta obra, co-edição entre a Fundação de Serralves e a Editora Relógio D’Água, resulta do desenvolvimento das conferências proferidas pelo Autor na Fundação de Serralves entre Novembro de 2017 e Março de 2018 e designadas por Arte e Infinitude.

22.11.18

Lançamento de «Lisboa, Livro de Bordo», de José Cardoso Pires, na Biblioteca Palácio Galveias




«Lisboa, Livro de Bordo», de José Cardoso Pires, vai ser apresentado na Biblioteca Palácio Galveias, em Lisboa, no próximo dia 26 de Novembro, segunda-feira, às 18:30.
O livro será apresentado por Francisco Vale e José Carlos Nascimento.
Maria do Céu Guerra, Luís Lucas e Carmen Santos lerão excertos do livro.



“Lisboa é uma cidade de que é fácil gostar. Não recusa nenhum acrescento, absorve-o. ‘Mesmo os aleijões’, dizia Cardoso Pires em entrevista filmada no Jardim do Torel, de câmara assestada à linha do horizonte, de recorte pregueado de telhados subitamente rompido pelo espinho das Torres das Amoreiras. (…) Passados 20 anos, a Relógio D’Água reformula o aspecto e o uso do texto. Com razão: continua vigoroso o discorrer, em tons de amor-ódio, sobre a vivência do espaço ancestral; mas a cidade de Cardoso Pires vai-se tornando mais rara de encontrar. Coube à fotografia de José Carlos Nascimento — com vasta utilização da urbe em vários trabalhos — recuperar o que do texto persiste visualmente, para apoio a uma leitura mais referenciável dos novos apaixonados de Lisboa.” [Do Prefácio de Ana Cardoso Pires]

Sobre Mrs. Osmond, de John Banville




Do vencedor do Man Booker Prize, o romance que continua a história de Isabel Archer, protagonista de Retrato de Uma Senhora, de Henry James, em territórios surpreendentes. 

No final do século XIX, Isabel Archer, uma jovem norte-americana, é enviada pela tia para a Europa, na esperança de que se familiarize com o mundo e adquira experiência.
Quando Isabel herda uma fortuna inesperada, é convencida a casar com um homem sedutor e quase sem recursos, Gilbert Osmond, que mais tarde se descobre ser cruel e enganador.
Numa viagem a Inglaterra para visitar o primo que está às portas da morte, Isabel tem uma hipótese de se livrar do casamento. Apesar disso, decide regressar a Itália. 
John Banville acompanha a história de Henry James até este momento. Mas Mrs. Osmond é uma criação de Banville: a criatividade narrativa, a precisão da lírica, as surpresas linguísticas, as camadas de intensidade emocional e psicológica, o subtil humor negro…
Mais tarde, o romance segue direções que o próprio James talvez se sentisse tentado a seguir.


De John Banville, a Relógio D’Água editou também Retalhos do Tempo — Um Memorial de Dublin.

Apresentação de Viagens, de Virginia Woolf






Hoje, às 17:00, o editor Francisco Vale e Jorge Vaz de Carvalho apresentam Viagens, de Virginia Woolf, no Edifício da Biblioteca da Universidade Católica Portuguesa, em Lisboa.

Sobre Middlemarch, de George Eliot




Middlemarch (1871-72) é o mais importante romance saído do período vitoriano. Nele, George Eliot aborda todos os temas fulcrais da vida moderna: arte, religião, ciência, política, carácter, sociedade e relações humanas.
Entre as suas personagens estão algumas das mais notáveis da literatura inglesa: Dorothea Brooke (a heroína), Rosamond Vincy (bela e egoísta), Edward Casaubon (o estudioso), Tertius Lydgate (um médico brilhante de duvidosa moralidade), Will Ladislaw (o artista) e Fred Vincy e Mary Garth (namorados de infância).

«Middlemarch é a sua [de George Eliot] mais subtil análise da imaginação moral, possivelmente a mais subtil que alguma vez foi conseguida na prosa de ficção.»

«George Eliot, tal como Emily Dickinson ou Blake, e tal como Shakespeare, repensou tudo para si mesma de uma ponta a outra. Ela é o romancista como pensador (não como filósofo), e frequentemente deturpamo-la porque menosprezamos a força cognitiva que ela traz às suas perspectivas.»

«O romance canónico, no verão da sua existência, pode ter atingido o seu Sublime em Middlemarch, cujo efeito sobre os leitores se mantém “incalculavelmente difusivo”.»

[Harold Bloom]

De George Eliot, a Relógio D'Água editou também O Moinho à beira do Floss.

Atribuídas bolsas de criação literária




A Direção-Geral do Livro, dos Arquivos e das Bibliotecas acaba de divulgar a lista das bolsas de criação literária que concedeu.
Entre os contemplados na ficção narrativa, estão Ana Teresa Pereira, Djaimilia Pereira de Almeida e Tatiana Salem Levy. Na poesia, foram contemplados Miguel Cardoso e Paulo Teixeira.

21.11.18

A chegar às livrarias: A Mão Esquerda das Trevas, de Ursula K. Le Guin (trad. Fátima Andrade)




Considerada uma obra maior da ficção científica, A Mão Esquerda das Trevas conta a história de um viajante solitário terrestre, enviado em missão para Inverno.
O objetivo da missão é permitir que Inverno seja incluído numa civilização galáctica. Os seus dois regimes políticos mais importantes são uma monarquia governada por um rei extravagante e um regime comunal, dirigido por uma burocracia minuciosa e racionalista.
Mas o mais estranho para o enviado terrestre é a particular androginia dos habitantes, que apenas numa dada fase assumem uma forma inteiramente feminina ou masculina, podendo ao mesmo tempo ser mães de umas crianças e pais de outras.
Este contacto com um modo de pensar diferente e as suas consequências nas relações pessoais e sociais permite alargar a compreensão da nossa própria realidade.


«Le Guin, mais do que Tolkien, elevou a fantasia à alta literatura, para o nosso tempo.» [Harold Bloom]

20.11.18

Sobre Suíte e Fúria, de Rui Nunes




«Uma criança rodeada de velhos, uma criança que descobre o mundo e se descobre perante ele. Além desse fundo mínimo, não ficaremos a saber muito mais. Não seria necessário. A presença de Heraclito, por seu turno, constitui um mecanismo de desarticulação. Permite ao texto interrogar a própria constituição de si. Que fazer com o peso da História, que fazer com a ideia de tempo, de personagens, de acção — com a noção, em última análise, de ficção? As palavras, perante estas circunstâncias, surgem como instrumento questionável, por entre aquilo que nunca deixa de ser um poder enorme: mesmo se limitado, falível — “Começamos a escrever o mundo e o mundo transforma-se numa frase com a harmonia provisória de uma eternidade qualquer” (p.59) Porém, a única eternidade possível é proporcionada por elementos, necessariamente, finitos, passageiros na sua efemeridade, como sejam marcas cíclicas, que apenas reforçam o passar do tempo — “só os castanheiros no seu outono continuam eternos” (p.62). Não se trata da rebusca de um paradoxo, mas da constatação do absurdo que mina a perscrutação da eternidade. Porque a memória da barbárie nazi nunca se afasta das preocupações — “Juntem mil corpos nus e terão a nudez, um substantivo abstracto, um conceito. E poderão decidir da morte, da vida ou do abandono.” (p.23) —, a escrita de Rui Nunes parece fazer-se sempre alheia ao optimismo de um projecto englobante e a grandiosas intenções construtivas. Porque a ruína espreita a cada passo da História, cabe a esta escrita, sobretudo, observar e registar (do modo mais impressivamente idiossincrático) o horror de que o ser humano se rodeia. Dizer, em suma, “um minucioso caminho de perda” (p. 86).» [Hugo Pinto Santos, Público, ípsilon, 16/11/18]

A chegar às livrarias: O Banquete, de Platão




Com 39 desenhos de Maria Helena Vieira da Silva, esta edição tem tradução, introdução e notas de Maria Teresa Schiappa de Azevedo.

«Desenvolvendo-se ao longo do tempo, em conversa com um Sócrates jovem, que aqui assume ironicamente o papel de discípulo, a exposição de Diotima orienta-se segundo o esquema antes definido por Ágaton: a natureza de Eros e os seus efeitos sobre os homens. A realidade contraditória do Amor prefigura-se com o mito do seu nascimento (203a-c), onde Platão alcança uma das suas mais belas e sugestivas criações artísticas (…).»[Da Introdução]

19.11.18

Sobre Três Mulheres com Máscara de Ferro, de Agustina Bessa-Luís




No âmbito da iniciativa Ano Agustina, mensalmente, ao longo de 2018, a Comunidade Cultura e Arte publicará uma crítica a um dos livros de Agustina Bessa-Luís, do catálogo reeditado pela Relógio D’Água.
No dia 18 de Novembro, foi publicado o texto de José Malta sobre «Três Mulheres com Máscara de Ferro»:

«A curta peça baseia-se no encontro destas três mulheres [Sibila, Fanny e Ema], cada uma com uma máscara de ferro, que se assemelham às Três Graças da mitologia grega. Cada uma delas, ao apresentar-se, retira a sua máscara dando assim a conhecer o seu rosto, iniciando uma conversa onde contam uma história marcante das suas vidas, algo que remete para as vivências de cada uma no no seu respectivo mundo. Deste modo entram em contacto três personagens de três mundos diferentes dentro do vasto universo literário de Agustina Bessa-Luís, numa espécie de conexão de mundos paralelos. O diálogo baseia-se no papel da mulher no universo literário sob o domínio do poder patriarcal, no qual surgem questões bastante pertinentes num enredo marcado também pela análise de cada personagem em relação às outras.» [Texto completo em https://www.comunidadeculturaearte.com/ano-agustina-tres-mulheres-com-mascara-de-ferro-o-encontro-de-tres-personagens-do-universo-de-agustina-bessa-luis/?fbclid=IwAR1wOZgqicep4v5vXIdACYg41cfCP2HQbX87S1fnl8AEolM1SozpHcQUFmQ ]

O Quarto de Marte e Assimetria escolhidos pela revista Time




A revista Time, através da sua crítica Lucy Feldman, escolheu os melhores dez livros de ficção saídos em 2018.
Os três primeiros lugares são ocupados por O Quarto de Marte (The Mars Room), de Rachel Kushner, Assimetria (Asymmetry), de Lisa Halliday, e An American Marriage, Tayari Jones.

Os dois primeiros foram editados pela Relógio D’Água.


Sobre O Quarto de Marte, de Rachel Kushner


Estamos em 2003 e Romy Hall enfrenta duas penas de prisão perpétua consecutivas na penitenciária feminina de Stanville, em Central Valley, na Califórnia.
Lá fora está o mundo do qual foi privada: a cidade de São Francisco da sua juventude e o filho, Jackson. Dentro, uma nova realidade: milhares de mulheres que lutam por bens essenciais à sobrevivência; os jogos, ostentações e atos casuais de violência perpetrados por guardas e reclusas; e o modo inoperante e absurdo que pauta a vida institucional nas prisões, que Kushner evoca com humor e precisão.



Sobre Assimetria, de Lisa Halliday

A primeira parte deste romance, «Delírio», desenrola-se em Nova Iorque, no pós 11 de Setembro de 2001, e aborda a ligação entre uma jovem assistente editorial e um escritor envelhecido, Ezra Blazer. Encontram-se na rua, onde ela o reconhece e ele toma a iniciativa de lhe falar. A narrativa aborda a ambiguidade na relação de um casal com idades assimétricas. De um lado, um autor famoso a quem o corpo foge. Do outro, uma mulher jovem que gostaria de escrever.
Uma segunda parte do livro, «Loucura», revela-nos personagens que atravessam as consequências da guerra do Iraque. Estamos em 2008 e Amar é um economista americano-iraquiano em viagem de Los Angeles para o Curdistão, retido no aeroporto londrino de Heathrow.  Amar é um homem dividido. Os pais desejam que ele se integre na sociedade norte-americana, mas a sua origem e preocupações arrastam-no para o Médio Oriente. E assistimos de novo às assimetrias próprias da nossa época, desta vez psicológicas, culturais e geográficas.



Rui Nunes entrevistado a propósito do seu último livro, Suíte e Fúria





«— Vê-se como um escritor à margem? Pensa nisso?
— Não, não penso. E nem percebo que digam isso. A margem não é um sítio onde eu esteja, é um sítio onde me põem. É completamente diferente.

— Mas sente que o põem à margem?
— Ah, sim. Quer dizer: sinto que me olham com alguma suspeita. E ao dizerem que a minha escrita está à margem, põem-me à margem. É uma escrita assim, é isto, é aquilo. Não é nada. A minha escrita é o meu olhar. Não me interessam muito as histórias. Quando quero uma boa história, vou a um policial — tenho lá óptimos. Tenho centenas de livros policiais — diverte-me, distrai-me. Mas não e isso que me interessa na escrita. Quando leio um escritor, quero saber como ele vê. Que relação estabelece ele com a realidade. Eu acredito que cada pessoa estabelece uma relação única com a realidade. E é essa relação que me interessa, não é uma história inventada e depois sofisticada para ser diferente. Não. Aquilo que me fascina é o olhar único, que se manifesta na escrita de cada autor. O que acontece é que a maior parte do que se escreve não tem atrás um olhar único. Não é nada. Tem atrás um vazio. E isso perturba-me, por isso não leio.» [Rui Nunes entrevistado por Hugo Pinto Santos, Público, ípsilon, 16/10/18, entrevista completa em https://www.publico.pt/2018/11/16/culturaipsilon/entrevista/rui-nunes-escrita-olhar-1850215 ]

16.11.18

Sobre Sonhos Elétricos, de Philip K. Dick




«Dick era um genial escritor de ideias, e antecipou todos os debates fundamentais sobre a tecnologia; mas enquanto nos romances explorava a fundo essas hipóteses teóricas, em muitos contos usava as ideias como ponto de partida ou de chegada, de um modo um pouco mais esquemático. Ainda assim, é inegável o interesse desta antologia, editada como companion piece da série televisiva “Electric Dreams” (Channel 4).
Podemos organizar estas histórias em três núcleos: as histórias de mundos inexistentes, de corpos estranhos e de actos de resistência. O primeiro conto do livro é sobre uma exposição que, no futuro, os historiadores dedicam ao séc. XX, sobre um incidente que acontece, e sobre um homem que investiga os factos, entra na exposição e depois se perde dentro dela, rodeado de objectos e noções que o futuro não entende, como jornais, panquecas ou democracia. No meio de imitações de um tempo antigo, George Miller experimenta então uma vida antiga, entretanto extinta, e percebe que prefere esse tempo, mais banal e mais livre, ao seu tempo.  É a primeira das “ficções paranóicas” desta antologia, exercícios sobre a possibilidade de haver vários mundos, e mundos mais reais do que outros.» [Pedro Mexia, Expresso, E, 10/11/2018]

15.11.18

«À volta o mar, no meio o inferno» — peça de Maria do Céu Guerra a partir de A Ilha de Sacalina n’A Barraca




Estreou ontem n’A Barraca a peça de Maria do Céu Guerra escrita a partir de A Ilha de Sacalina, de Anton Tchékhov, editada pela Relógio D’Água.
A peça está em palco de quarta a sábado, às19:00, e domingo às 17:00, e conta com a participação de Ruben Garcia, Sérgio Mora, Sónia Barradas e Maria do Céu Guerra, entre outros actores.



«Quando Tchékhov, então um jovem médico, partiu para a ilha de Sacalina em Abril de 1890, ninguém compreendeu as suas motivações. Ele próprio, incapaz de se explicar, falou de mania sachalina.
Nabokov fez-se eco dessa perplexidade: “Normalmente, os críticos que escrevem sobre Tchékhov repetem que acham de todo incompreensível o facto de, em 1890, o escritor ter empreendido uma perigosa e fatigante viagem à ilha de Sacalina para estudar a vida dos condenados aos trabalhos forçados.”
Trata-se, de qualquer modo, do episódio mais estranho da vida de Tchékhov. Tendo decidido investigar aquele lugar maldito, pôs-se a caminho, em condições mais do que precárias. Decidira não se apresentar como jornalista e não possuía qualquer carta de recomendação ou documento oficial. Após dois meses e meio de viagem extenuante, o mais provável era ser obrigado a regressar.

Enfrentou o frio, a chuva, as inundações e os incêndios, e finalmente lá estava, ao largo da Sibéria, a ilha de Sacalina: “Em redor o mar, no meio o inferno.”» [Da contracapa do livro]

A chegar às livrarias: Fuck The Polis, de João Miguel Fernandes Jorge





«UMA CADEIRA

De espaldar azul
assento de palha

perde-se
na parede branca

a sombra»

A chegar às livrarias: Para Comigo, de Joaquim Manuel Magalhães




«Inverno em Vila Real. O nevão
cobria a rua do liceu.
Uma luva de cabedal amodorrado
no tampo, o vapor do alento
liga-nos à toada de um remoinho.
O meu tumulto ensombra-te.

Um pombo protegido no beiral,
a cabeça na plumagem de procela.
Tu calado, eu afeito ao silêncio, delineava-se
no papelão do compêndio uma letra
do nosso nome em conjunto,
única sílaba fora de alfabeto algum.
Que bem tão mal na confeitaria, sem o padrão ainda,
se convinha, se faltava à aula, na sediciosa ocasião
de um inaugural amor.

O foro furtivo já desagregava.
Nem te projetaria sequer
na luta em sobressalto do meu rumo.
Porém, sempre que falarem da neve
e o que for teu vier pela avenida

algo do desaparecimento, quem sabe, te recordará.»

Hoje, às 18:00, lançamento de A Saga de Selma Lagerlöf de Cristina Carvalho no Teatro da Politécnica, em Lisboa




O romance biográfico A Saga de Selma Lagerlöf, de Cristina Carvalho, vai ser apresentado no Teatro da Politécnica, na Rua da Escola Politécnica, n.º 54, em Lisboa, no dia 15 de Novembro, quinta-feira, às 18:00.
O livro será apresentado por Jorge Silva Melo.

«Este romance biográfico foi escrito a horas imprecisas do dia ou da noite; não obedeceu a nenhuma rotina disciplinada. Como em todos os actos de paixão, fui sobrevivendo em equilíbrios improváveis.
Conheci regiões que jamais imaginei conhecer, reconheci a vida desta pessoa, imaginei-a com a possível intimidade.
Julguei, muitas vezes, ouvi-la.

O conhecimento dessa vida foi como o silvo das auroras boreais ou como o zurzir do relâmpago na noite profunda.»

14.11.18

A chegar às livrarias: As Farpas, de Eça de Queiroz (organização, introdução e notas de Maria Filomena Mónica)





Pela primeira vez publicam-se integralmente as «Farpas» de Eça de Queiroz, separadas das que foram originalmente escritas e publicadas por Ramalho Ortigão e pelo próprio Eça ao longo dos anos de 1871 e de1872, e que, até hoje, forma sempre reeditadas em conjunto e sem a identificação das respectivas autorias.

Sobre Contos, de Saki




«Saki era o pseudónimo de Hector Hugh Munro, nascido na Birmânia filho de um chefe da polícia imperial britânica. A mãe morreu-lhe aos dois anos dos efeitos indirectos do ataque de um bovino tresmalhado e, em resultado do infausto caso, o jovem foi severamente educado pela avó e por umas tias solteiras.
À parte isso, depois de uma tentativa frustrada de seguir as pisadas do pai, dedicou-se ao jornalismo, nomeadamente como correspondente nos Balcãs, e à escrita mais duradoura. Tendo começado como autor de um livro histórico sobre a Rússia, veio a especializar-se no conto sarcástico, e notabilizou-se como crítico insidioso e acerbo da sociedade inglesa do início do século xx.

Publicou durante a vida quatro livros de contos (Reginald, Reginald in Russia, Chronicles of Clovis e Beasts and Superbeasts), de onde se tiraram os que compõem este livro.» [Da Introdução]

13.11.18

A chegar às livrarias: Assimetria, de Lisa Halliday (trad. Inês Dias)





A primeira parte deste romance, «Delírio», desenrola-se em Nova Iorque, no pós 11 de Setembro de 2001, e aborda a ligação entre uma jovem assistente editorial e um escritor envelhecido, Ezra Blazer. Encontram-se na rua, onde ela o reconhece e ele toma a iniciativa de lhe falar. A narrativa aborda a ambiguidade na relação de um casal com idades assimétricas. De um lado, um autor famoso a quem o corpo foge. Do outro, uma mulher jovem que gostaria de escrever.
Uma segunda parte do livro, «Loucura», revela-nos personagens que atravessam as consequências da guerra do Iraque. Estamos em 2008 e Amar é um economista americano-iraquiano em viagem de Los Angeles para o Curdistão, retido no aeroporto londrino de Heathrow.  Amar é um homem dividido. Os pais desejam que ele se integre na sociedade norte-americana, mas a sua origem e preocupações arrastam-no para o Médio Oriente. E assistimos de novo às assimetrias próprias da nossa época, desta vez psicológicas, culturais e geográficas.

“Assimetria é extraordinário… A prosa de Halliday é de tal forma estranha e inteligente que a sua mera existência parece um comentário ao estado atual da ficção… É um primeiro romance que se lê como um livro de um autor que já publicou vários ao longo da vida.” [The New York Times Book Review]

“‘Assimetria’ capta de forma sublime o isolamento, a insatisfação e a dor de ser humano.” [Time]


“Halliday entra no palco literário com a energia de uma principiante mas com a confiança de um escritor experiente.” [Louise Erdrich]