31.10.16

A chegar às livrarias: Dança no Escuro — A Minha Luta: 4, de Karl Ove Knausgård (trad. de Miguel Serras Pereira)



 

Depois de terminar os estudos secundários, Karl Ove desloca-se para uma remota vila piscatória para trabalhar como professor. Não possui qualquer interesse nesse trabalho — ou em qualquer outro — e o seu único objectivo é o de poupar dinheiro e começar a escrever.
Tudo corria bem, até ao momento em que as noites se começam a alongar, e a sua vida sofre uma mudança repentina. A bebida causa-lhe desmaios, as sucessivas tentativas de perder a virgindade terminam em humilhação, e, para sua angústia, apaixona-se por uma sua aluna.
Tudo isto enquanto a sombra do seu pai parece cada vez maior.

«Belamente humano… Ser levado para o mundo de Knausgård é um prazer inevitável.» [The Times]
 
«Afirma-se como o maior acontecimento literário do século XXI.» [Guardian]

A chegar às livrarias: No Outono, de Karl Ove Knausgård, com ilustrações de Vanessa Baird (trad. de Pedro Fernandes)




 

«28 de agosto. Agora, no momento em que escrevo isto, não sabes nada, nada do que te espera, do mundo a que vais chegar. E eu nada sei de ti. Vi uma imagem na ecografia, e pus uma mão sobre o ventre em que estás, é tudo. Faltam seis meses para nasceres e muito pode acontecer durante esse tempo, mas eu creio que a vida é forte e inexorável, e creio que tudo se vai passar bem contigo e que vais nascer perfeita, saudável e forte. Vir à luz, diz-se. Quando a tua irmã mais velha, a Vanja, nasceu, era de noite, a neve rodopiava na escuridão. Um momento antes de ela nascer, uma das parteiras puxou-me, tu vais recebê-la, disse ela, e foi o que fiz, um bebé deslizou para as minhas mãos, escorregadio como uma foca. Eu estava tão feliz, que até chorei. Quando a Heidi nasceu, um ano e meio mais tarde, era outono e o céu estava encoberto, o tempo estava frio e húmido como pode estar em outubro, ela chegou de manhã, o parto foi rápido, e quando a cabeça estava de fora, mas não o resto do corpo, ela emitiu um pequeno som com os lábios, foi um momento tão sereno.»

A chegar às livrarias: Benoni, de Alexandre Andrade




«Entre a cidade e a vila, entre o seu manuscrito e a inércia, assim vivia Benoni. Nada o ligava àquela pequena povoação do interior, excepção feita a um punhado de amigos chegados, também eles, na sua maior parte, visitantes de ocasião, que para ali confluíam periodicamente. Quanto ao resto, nem memórias, nem aspirações, muito menos raízes. Talvez por isso mesmo não acreditava que a atracção sentida por aquele lugar pudesse ser apenas um capricho persistente ou um efeito secundário. Sem hesitar, e sempre que lhe era possível, largava tudo e vinha ali passar uns dias.
(…)
Era naquela época que despontavam as flores, as invejas e os amores. As flores, naturalmente, as invejas, lentamente, os amores em sobressalto. Benoni nem se atrevia a tentar calcular quantos palermas faziam a corte à jovem Lia, por cada ano que passava. A acreditar no que se contava à boca cheia, ninguém, nem sequer o velho e embrutecido taberneiro (especialmente o velho e embrutecido taberneiro) se mostrara insensível aos seus encantos. Tudo começava com uma manhã passada ao nível da terra fria, esperando o momento em que Lia surgiria caminhando em beleza, como a noite de um clima sem nuvens e de céus estrelados, em busca de água para si e para o seu avô, este confinado a uma cadeira de rodas e à amargura. “A pequena vai buscar água, e é tudo? Não se passa nada de escabroso?”, estranhava Benoni, conversando com potenciais, actuais ou pretéritos.»

27.10.16

A chegar às livrarias: Cegueira Moral, de Zygmunt Bauman e Leonidas Donskis





Neste diálogo entre Zygmunt Bauman e Leonidas Donskis fala-se da perda de sensibilidade num tempo marcado pelo terrorismo, a guerra, as migrações e outras formas de violência.
A empatia, a capacidade de nos colocarmos no lugar dos outros, parece diminuir quando era mais necessária. E isso vai a par com a feroz busca de identidade e o desrespeito pela privacidade alheia.
A violência e os desastres tornam-se tão constantes na televisão e nas redes sociais que as sociedades padecem de uma espécie de cegueira moral, de tal modo estão insensibilizadas para o sofrimento e se recusam a compreender o que se passa.


«À medida que a negligência moral cresce em alcance e intensidade, a procura de analgésicos aumenta cada vez mais, e o consumo de tranquilizantes morais transforma-se em vício. Por conseguinte, uma insensibilidade moral induzida e manipulada torna-se uma compulsão ou uma “segunda natureza”: uma condição permanente e quase universal — e as dores morais veem-se desprovidas do seu papel salutar de prevenir, alertar e mobilizar.» [Zygmunt Bauman]

24.10.16

Sobre Karen, de Ana Teresa Pereira




«Em Karen, a escrita de Ana Teresa Pereira adquire uma intensidade particularmente difusa, que joga com vários matizes e referentes. (…)
Mas a neve recusa-se a cair, é apenas chuva no magnífico final deste romance, cuja “banda sonora” fica entregue a Keith Jarrett e Mark Eitzel. E torna-se impossível não nos lembrarmos do cineasta Andrei Tarkovsky quando surge o propósito de acender algumas velas “para salvar o mundo”. Tem sido esse o modo de escrita de Ana Teresa Pereira, embora quase ninguém dê por isso. E não é sequer de espantar que os temas destas variações mudem pouco: “Em tempos pensava que todas as histórias eram uma só, a luta entre o anjo bom e o anjo caído, e sempre à beira de um abismo. Mas havia uma segunda história, a rapariga que se apaixonava por um homem numa casa assombrada por outra mulher.”» [Manuel de Freitas, Expresso, E, 22-10-2016]

Sobre Ficar na Cama e Outros Ensaios, de G. K. Chesterton




«Como todos os bons ensaístas, Chesterton tem um fino dom de observação e a capacidade de fazer distinções, exprimindo a ideia resultante num paradoxo que, além de hábil, tende a ser verdadeiro. As nove dezenas de peças aqui reunidas, selecionadas por Alberto Manguel a partir das várias recolhas que Chesterton publicou, ocupam-se de temas tão diversos como a literatura e a (má) escrita, a contemplação de coisas banais, a Idade Média e São Francisco, os méritos de correr atrás do próprio chapéu na rua e o potencial criativo de ficar na cama. Genial, para usar um cliché.» [Luís M. Faria, Expresso, E, 22-10-2016]

18.10.16

Maria Filomena Molder fala ao JL







A propósito da recente edição na Relógio D’Água de Rebuçados Venezianos, a ensaísta e filósofa Maria Filomena Molder deu uma entrevista a Maria Leonor Nunes do JL. É uma das mais importantes concedidas pela autora de A Imperfeição da Filosofia, nela abordando a sua evolução intelectual e as relações entre arte e filosofia.

 

«— Lembra nesse texto de Rebuçados como se surpreendeu com os bailarinos que caíam, quando sempre tinha acreditado que a dança queria evitar a queda.

— Sim, a queda era uma falha, um desacerto e ali era um movimento desejado, sem dúvida controlado por uma técnica extraordinária. O coração da arte é a técnica. No caso, saber como fazer do corpo um instrumento. Para cair, por exemplo.

— E poder-se-á dizer que o seu pensamento “dança”?

— Talvez o que eu faça seja um substituto dessa impossibilidade. O pensamento tem tendência a aguentar-se no ar, sem ter em conta a força da gravidade. Esse é um dos seus perigos (risos). Hermann Broch tinha uns oito anos quando, como sucede com outras crianças, lhe aconteceu aquilo a que chamou “cair em si”, perceber que um dia ia morrer. Recorda na sua autobiografia que estava a brincar num bosque, perto de Viena, e percebeu que estava sozinho no mundo. Descobriu a solidão da vida humana e que a morte é um acontecimento literário. O pensamento é uma tentativa de superação, uma espécie de protecção contra a morte. Move-se numa área em que ninguém pode viver. Esse é um risco.

 
(…)


— O “estranho” sempre a atraiu. Porquê?

— Escrevi-o a propósito da minha adolescência. Em geral, o adolescente está espontaneamente preparado para saltar para fora do que lhe ensinaram, para criticar, recusar. Mais tarde compreendi que realmente gostava do que não percebia. O estranho atraía-me. Pessoas que não compreendia, obras quase ilegíveis, em cuja leitura persistia.

 
(…)


— O que a levou a juntar estes textos em Rebuçados Venezianos?

— Já tinha publicado um conjunto noutro livro sobre arte e artistas, que incluía textos sobre Ana Vieira, Helena Almeida, Rui Chafes e também sobre o texto de Walter Benjamin Mancha e sinal, uma matriz excepcional sobre a diferença entre a pintura e o desenho. A certa altura, percebi que tinha escrito sobre muitos artistas, depois de 2000, e pensei juntá-los noutro volume.» [JL, 12-10-2016]

14.10.16

Louvor e decepção à volta do Nobel





A atribuição do Nobel de Literatura a Bob Dylan provocou em Portugal reacções tão desencontradas como significativas.
O Nobel é o principal prémio literário internacional. Mas nem por isso deixa de estar confinado ao horizonte da Academia Sueca, por mais que esta tente alargá-lo com traduções de autores das mais variadas línguas e geografias.
Além disso, se colocarmos num prato da balança os escritores que receberam o Nobel e resistiram à passagem dos anos, e no outro os grandes romancistas que nunca o receberam, de Conrad, Proust e Virginia Woolf a J. L. Borges, é bem provável que o equilíbrio se rompa a favor destes últimos.
E há ainda, claro, uma ou duas dezenas de escritores que poderiam receber o prémio este ano, de Javier Marías a Cormac McCarthy, e que, mesmo entre os poetas de canções, haveria também Leonard Cohen e Chico Buarque.
Mas parece que a Academia Sueca está decidida a inovar e a alargar as margens tradicionais do que considera literatura nobelizável, desiludida talvez com a inexistência de grandes romances na última década. Isso explica escolhas inesperadas como foram no seu tempo a de Churchill, de Selma Lagerlöf (primeira mulher a receber o Nobel), a de um actor como Dario Fo, de uma contista como Alice Munro ou das narrativas jornalísticas de Svetlana Alexievich.
Até por isso as reacções são significativas. Abstraindo do «paternalismo» e visão conspirativa do escritor Bruno Vieira Amaral, que afirma que a Academia lhe atirou o prémio à cabeça e que Bob Dylan não merecia tal gesto, houve dois tipos de reacções.
A dos poetas e críticos ligados à música, de Miguel Esteves Cardoso a Pedro Mexia, que se mostraram favoráveis ou até entusiasmados.
E, no pólo oposto, a de alguns editores, críticos e escritores a quem Dylan pouco diz ou que tinham na lista de expectativas nomes que iam de Philip Roth a Adonis, passando por Pynchon, e tiveram reacções perplexas ou desfavoráveis.
Há também o caso de editores que condicionam o seu catálogo à procura dos nobelizáveis e que estão cada vez mais condenados a uma desilusão anual em Outubro.
E o mesmo sucede com autores que a meio da vida vão acomodando a escrita à procura de um prémio que afinal só traz uma fama anual, algumas vendas mais, uma viagem invernosa a Estocolmo e solicitações capazes de perturbar a mais fecunda das imaginações.
Foi assim que tivemos Alice Vieira a acusar esta atribuição do Nobel de desvirtuamento e a indicar Murakami como alternativa (como se o Nobel tivesse um passado de opções infalíveis, quando dezenas de escritores que escolheu são só hoje lembrados pelos seus familiares com boa memória).
Recorde-se que, quando o Nobel foi atribuído em 2013 a Alice Munro, a escritora Inês Pedrosa «denunciou» o facto de o prémio ser entregue a uma simples contista (o que não impede que o seu último livro seja de contos e que sublinhe agora a importância deste género literário).
Ou seja, há ainda muitos críticos e autores ligados ao perfil que durante décadas serviu de referência à Academia Sueca e que Javier Marías resumiu no seu artigo «Não tão Memoráveis»:
«O escritor “conhecido” e popular terá além disso de (…) proclamar que apoia os oprimidos do mundo; ser um pouco perseguido no seu país (ou, à falta disso, dizer que o é); clamar muito no deserto e ser voz estridente das consciências adormecidas; deverá ser solene ou um pouco sombrio, a amargura nunca é de mais; a sua obra deve reflectir a miséria do homem contemporâneo, ou a fragilidade do homem contemporâneo, ou o desconcerto do homem contemporâneo, ou o seu egoísmo, ou o seu sofrimento, ou a sua maldade, ou a sua desorientação (em qualquer caso, algo negativo do homem contemporâneo, ou melhor, um lugar-comum a todas as contemporaneidades); por último, não deve falar muito de literatura nem ter qualquer sentido de humor.»
De qualquer modo, em favor de Bob Dylan pode dizer-se que com a sua obra musical e literária será um dos vencedores do Nobel que vai perdurar. Levou o melhor da poesia à música, absorvendo influências que vão de Walt Whitman a Ashbery, passando por Allen Ginsberg e outros autores da Beat Generation. Faz parte de uma linhagem antiquíssima que vai dos rapsodos gregos a Leonard Cohen, passando pelos trovadores medievais. Nas suas letras criou personagens que nada devem às de obras de narrativa ficcional. E as suas crónicas inacabadas constituem uma referência de literatura autobiográfica.

P. S. Declaração de interesses. A Relógio D’Água publicou em 2006 em dois volumes uma ampla antologia da poesia de Bob Dylan (Canções 1962-2001).


Francisco Vale

13.10.16

Prémio Nobel da Literatura 2016 atribuído a Bob Dylan



 

Bob Dylan (Robert Allen Zimmerman) nasceu em Duluth, Minnesota, em 24 de Maio de 1941, descendente de emigrantes judeus da Lituânia, Rússia e Ucrânia.
Como aconteceu com tantos outros músicos, Bob Dylan procurou nos agitados anos 60 novas vias de expressão, dando voz aos deserdados e abordando as suas próprias experiências. Mas desde muito cedo as suas composições integraram e revitalizaram também as tradições musicais norte-americanas, as baladas do Norte e os blues do Sul.
Dylan procedeu assim a uma renovação musical que se prolonga até aos nossos dias, absorvendo e expandindo velhas tradições e levando a literatura ao rock‘n’roll.
Uma das suas músicas (“Like a Rolling Stone”, de 1965) tem sido repetidamente considerada como uma das melhores canções de sempre. Estes volumes, bilingues, reúnem as suas composições de 1962 a 2001, traduzidas por Angelina Barbosa e Pedro Serrano.
 
«Como Uma Pedra a Rolar»
Era uma vez tu vestias-te tão bem
Atiravas um cêntimo aos mendigos no teu apogeu, não era?
As pessoas avisavam-te, diziam: «Cuidado boneca, olha que vais cair»
Pensavas que te estavam todos a gozar
Costumavas rir de
Toda a gente que andava por ali
Agora não falas tão alto
Agora não pareces tão orgulhosa
Por teres de andar a cravar a próxima refeição.
 
Que tal é a sensação
Que tal é a sensação
De se estar sem lar
Como um perfeito estranho
Como uma pedra a rolar?
 
Andaste na melhor escola, tudo bem, Miss Solitária
Mas sabes que lá apenas te espremiam
E nunca ninguém te ensinou a viver na rua
E agora descobres que vais ter de te habituar a isso
Dizias que jamais te comprometerias
Com o vagabundo mistério, mas agora dás-te conta
Que ele não vende nenhuns álibis
Enquanto pasmas para o vácuo dos seus olhos
E lhe perguntas queres fazer negócio?
 
Que tal é a sensação
Que tal é a sensação
De se estar por sua conta
Sem um caminho para casa
Como um perfeito estranho
Como uma pedra a rolar?
 
Nunca te viraste para ver os cenhos franzidos dos malabaristas e dos palhaços
Quando todos eles se chegavam e faziam habilidades para ti
Nunca percebeste que isso não é nada bom
Não devias deixar os outros divertirem-se por ti
Costumavas montar o cavalo cromado com o teu diplomata
Que trazia ao ombro um gato siamês
Não é duro descobrires que
Ele realmente não era o máximo
Depois de te levar tudo quanto pôde roubar
 
Que tal é a sensação
Que tal é a sensação
De se estar por sua conta
Sem um caminho para casa
Como um perfeito estranho
Como uma pedra a rolar?
 
Princesa no campanário e todas as pessoas bonitas
Bebem, pensando que têm o sucesso garantido
Trocando toda a espécie de prendas e coisas preciosas
Mas era melhor que fanasses o teu anel de diamantes, era melhor que
o pusesses no prego, querida
Costumavas ficar tão divertida
Com o Napoleão andrajoso e a linguagem que ele usava
Vai ter com ele agora, ele chama-te, não podes recusar
Quando não se tem nada, não se tem nada a perder
Agora és invisível, não tens segredos a esconder
 
Que tal é a sensação
Que tal é a sensação
De se estar por sua conta
Sem um caminho para casa
Como um perfeito estranho
Como uma pedra a rolar?


 

11.10.16

A chegar às livrarias: O Dom, de Vladimir Nabokov (trad. de Carlos Leite)





«Retrato, entre outras coisas, do artista enquanto jovem, o último romance que Vladimir Nabokov escreveu em russo (publicado em folhetim em 1938 e em inglês em 1963), O Dom, é considerado por muitos um dos maiores romances russos — e anglo-saxónicos — do século XX. Tem, no centro do seu puzzle narrativo, a literatura russa (VN, Prefácio) do século XIX, Puchkin, Gogol, Tchekhov, a par da visualização nabokoviana do processo criativo e da afirmação do talento artístico, da peregrinação urbana e do monólogo joyceano, do maléfico jogo de espelhos borgeano da realidade e da ficção, da sedução de uma autenticamente moderna história de amor, do pessoano trauma dos mundos perdidos, etc... A primeira leitura transforma-se rapidamente em releitura, porque, como também disse VN, o leitor não é um carneiro e nem todas as penas o tentam.» [Carlos Leite]

7.10.16

The Association of Small Bombs, de Karan Mahajan, finalista do National Book Award




Foram anunciados ontem os finalistas dos National Book Awards. The Association of Small Bombs, de Karan Mahajan, é um dos finalistas na Ficção, ao lado de obras de Chris Bachelder, Paulette Jiles, Colson Whitehead e Jacqueline Woodson. O júri é constituído por James English, Karen Joy Fowler, T. Geronimo Johnson, Julie Otsuka, Jesmyn Ward, e o vencedor será anunciado no próximo dia 16 de Novembro.

A Relógio D’Água publicará a tradução de The Association of Small Bombs.

Breve História de Sete Assassinatos, de Marlon James, no pequeno ecrã





A Relógio D’Água publicará em Novembro a obra vencedora do Man Booker Prize de 2015, Breve História de Sete Assassinatos, de Marlon James, em tradução de José Miguel Silva.
A HBO adquiriu o direito de opção de adaptação do livro, com planos de uma série televisiva, ainda sem data anunciada. A adaptação será feita pelo próprio autor e pelo argumentista Eric Roth.

A chegar às livrarias: Pape Satàn Aleppe, de Umberto Eco (trad. Jorge Vaz de Carvalho)







Crise das ideologias, crise dos partidos, individualismo desenfreado…
Este é o ambiente em que nos movemos hoje, uma sociedade líquida onde nem sempre é fácil encontrar uma estrela polar, mesmo que não seja difícil encontrar estrelas e estrelinhas.
Nesta sociedade tornam-se habituais as máscaras dos políticos, as obsessões mediáticas de visibilidade que a quase todos parece atingir, a relação simbiótica com os telefones mais ou menos inteligentes, a ausência de cortesia nas relações. São estes aspectos e muitos outros que Umberto Eco aborda neste livro publicado após a sua morte em Fevereiro de 2016.
É uma sociedade a que já Zygmunt Bauman chamou «líquida», em que a ausência de sentido prevalece sobre a racionalidade, com evidentes efeitos cómicos mas também com consequências que não são propriamente tranquilizadoras.
Confusões, desconexões, torrentes de palavras muitas vezes próximas do lugar-comum. «Pape Satàn, pape Satàn aleppe!», dizia Dante [no Inferno VII, 1], convocando prodígios, dores, iras, ameaças e talvez ironias.

Pape Satàn Aleppe é um livro póstumo de Umberto Eco, reunindo textos que publicara em vida e que preparava para edição antes da sua morte, ocorrida em Fevereiro de 2016.

Alexandre Andrade em Encontro Literário





 

Alexandre Andrade estará hoje, dia 7 de Outubro, presente na Biblioteca Municipal Fernando Piteira Santos, da Amadora, para participar no Clube Literário da Amadora.



O encontro, a propósito do seu mais recente livro, O Leão de Belfort, terá início pelas 21:00.

3.10.16

Viajar É Preciso, por Francisco Vale

 


 


A forma de viajar que se está a tornar mais comum é a de “viajar sem ver”, para usar a expressão de Andrés Neuman.
Milhares de turistas desembarcam de paquetes, aviões e autocarros em cidades como Lisboa, fazem percursos de várias horas ou permanecem alguns dias e registam imagens que colocam nas redes sociais ou levam consigo. Partem sem quase conhecer ninguém nem ver para lá das aparências.
A parte antiga das cidades tende a uniformizar-se, desaparecem muitas das formas de vida e comércio que as tornavam diferentes e foram no passado uma das principais razões para viajar. Os centros de Veneza, Berlim, Praga, Roma, Lisboa, Londres ou Paris são hoje esplanadas do mundo.
Claro que há os que seguem fielmente os Guias de Viagem e têm uma ideia da história e da importância dos locais que visitam. Mas acabam por se acotovelar em multidão para espreitar a inacabada Sagrada Família em Barcelona, a Torre de Belém, os dourados do Taj Mahal, a Estátua da Liberdade em Nova Iorque ou os Guerreiros de terracota de Xian. E partem com a frustração de não terem visitado outros locais que os guias mais ou menos Michelin consideram imperdíveis.
Hoje já não são possíveis, pelo menos no nosso planeta, viagens de descoberta e conhecimento de que foram exemplos as de Alexandre Rodrigues Ferreira, Humboldt, Darwin, Alfred Wallace e Pedro António de Andrade (que nos deixaram obras científicas como Diário da Viagem Filosófica, A Viagem do Beagle ou Cosmos). Nem sequer são prováveis viagens tão perigosas como as narradas por Fernão Mendes Pinto, Alexandra David-Néel, Jack London, Annemarie Schwarzenbach, Freya Stark, Edith Wharton e Robert Byron.
Mas é possível evitar que a viagem se torne “uma travessia das aparências”.
E é em contracorrente às formas de “viajar sem ver” que a Relógio D’Água relança agora a sua colecção de Viagens com títulos como As Ilhas Gregas, de Lawrence Durrell, Homenagem a Barcelona, de Colm Tóibín, Roma, de Gógol, Paris França, de Gertrude Stein, e Inverno no Próximo Oriente, de Annemarie Schwarzenbach.
Estes livros valem por si, permitem voos de imaginação sem esperas de aeroporto.
É uma “viagem”, a descrição que Durrell faz da vida quotidiana nas ilhas de Corfu, Samos, Creta ou Naxos, com a sua paisagem impregnada de história e mitos (embora não nos possa dar o calor, o cheiro, as cores, as vozes incompreensíveis e os acasos de uma visita pessoal).
E depois de lermos Homenagem a Barcelona nunca mais a capital da Catalunha nos parecerá a mesma.
Há quem prefira viajar com o olhar desprevenido, sabendo pouco dos locais que visita com uma espécie de ignorância deliberada. Fica-se assim mais disponível para o assombro de uma primeira visão do Machu Picchu, da terra vermelha em África, dos fiordes nórdicos ou da esfuziante vida das Ramblas, numa espécie de avidez inicial. E afinal perder-se numa cidade é, como dizia Walter Benjamin, uma arte. Mas, mesmo nestes casos, a posterior leitura de um livro permite revisitar esses locais através de um outro olhar e algum tempo depois as impressões recebidas e as que lemos confundem-se na memória.
Mas o melhor ainda é viajar para locais que previamente se conhecem, que se “leram” antes ou que se vão conhecendo à medida que para lá vamos.
A escolha dos meios de transporte é uma importante decisão do viajante, não sendo por acaso que ocupavam só por si um lugar essencial  na narrativa das viagens até finais do século xix, como podemos ver em Viagens com Uma Burra pelas Cevenas, de R. L. Stevenson.
O ritmo é essencial, sendo diferente a viagem em que mal se tem tempo para registar uma imagem fotográfica de um vendedor de tapetes num souk de Marraquexe e aquela em que se pode aceitar um chá e negociar com o habitual faz-de-conta que acreditamos em todas as magnificências que nos exibem.
Mas, até quando não viajamos com vagares de caminhante, é possível recuperar muito do que se perde lendo o livro certo. Pode assim combinar-se o espanto real de uma primeira vez com a nostalgia do “já visto”, “ver” as ruas de Paris, sabendo que foi naquele restaurante que Joyce bebia vinho branco e naquela praça que se tomou a Bastilha, amanhecer numa ilha grega atentos ao rumor dos mitos que se retiram, ou visitar Els Quatre Gats de Barcelona, sabendo que ali se sentaram e expuseram Picasso e Miró.


Publicado, em versão ligeiramente diferente, no Jornal de Letras, 14 de Setembro de 2016.