«— Vê-se como um escritor à margem? Pensa nisso?
— Não, não penso. E nem percebo que digam isso. A margem não é um sítio onde eu esteja, é um sítio onde me põem. É completamente diferente.
— Mas sente que o põem à margem?
— Ah, sim. Quer dizer: sinto que me olham com alguma suspeita. E ao dizerem que a minha escrita está à margem, põem-me à margem. É uma escrita assim, é isto, é aquilo. Não é nada. A minha escrita é o meu olhar. Não me interessam muito as histórias. Quando quero uma boa história, vou a um policial — tenho lá óptimos. Tenho centenas de livros policiais — diverte-me, distrai-me. Mas não e isso que me interessa na escrita. Quando leio um escritor, quero saber como ele vê. Que relação estabelece ele com a realidade. Eu acredito que cada pessoa estabelece uma relação única com a realidade. E é essa relação que me interessa, não é uma história inventada e depois sofisticada para ser diferente. Não. Aquilo que me fascina é o olhar único, que se manifesta na escrita de cada autor. O que acontece é que a maior parte do que se escreve não tem atrás um olhar único. Não é nada. Tem atrás um vazio. E isso perturba-me, por isso não leio.» [Rui Nunes entrevistado por Hugo Pinto Santos, Público, ípsilon, 16/10/18, entrevista completa em https://www.publico.pt/2018/11/16/culturaipsilon/entrevista/rui-nunes-escrita-olhar-1850215 ]
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