31.10.17

Sobre Lincoln no Bardo, de George Saunders




«Em 2012, decide avançar para o primeiro romance. Lincoln no Bardo (Relógio D’Água, 2017) resulta desse episódio no cemitério de Georgetown, das leituras que faz durante a investigação, e de quatro anos de um trabalho de criação que valoriza a intuição e despreza o planeamento. Como um optometrista que acerta as lentes de um paciente, Saunders escreve, rescreve e pergunta: “É melhor assim ou assim?” O romance, ao contrário do que acreditara, durante anos, pode afinal reger-se pelos mesmos princípios e regras que usou nos contos. Não há novas ferramentas. Há apenas um quadro mais vasto dentro do qual a história pode acontecer.
Mal o livro sai, é logo aclamado pela crítica. Top de vendas. Vencedor da edição deste ano do Man Booker Prize. Uma obra que começa por nos desafiar a entrar naquela que foi a pior noite na vida de Lincoln, ainda que o repto lançado ao leitor não se limite a pedir-lhe que lide com esse pai tolhido pela dor.
Estudante de Nyingma Buddhism, Saunders cria em Lincoln no Bardo uma narrativa que se passa numa espécie de purgatório. O tal “bardo” do título mais não é do que o lugar de transição entre a morte e a reencarnação, de acordo com o budismo tibetano. No processo, e seguindo o caminho da intuição e do improviso, Saunders vai intercalando capítulos onde só constam frases, citações, que foram retiradas de fontes históricas com diálogos ou monólogos que o próprio escreve a partir dos fantasmas falantes que cria na sua mente. (…)

O júri do Man Booker Prize considera Lincoln no Bardo um romance com uma forma e estilo completamente originais. Mas isso, por certo, não seria suficiente para ganhar o prémio. Há sempre uma dimensão humana a que não se deve escapar, e essa, em Lincoln no Bardo, salienta o júri, está no facto de o romance explorar a experiência da empatia. Haverá pior sofrimento no mundo do que o de um pai ou de uma mãe que perde um filho?» [Cristina Margato, E, Expresso, 28/10/17]

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