«Hoje
na Sábado escrevo sobre Escombros, de Elena Ferrante (n. 1943).
Chave: “Uma história é antes o precipício
das mais diversas experiências, acumuladas ao longo da vida.” Quem o diz é
a autora, numa das entrevistas coligidas para a nova edição do livro de 2003
que foi agora reeditado em Itália. (…) Três itens centrais: o direito ao
anonimato, a “verdade” em literatura, a defesa intransigente do feminismo.
Sobre este último tópico, bem defendido do ponto de vista teórico, faz ouvir
uma voz desalinhada: “Temo a linearidade das militâncias, em
literatura têm um péssimo efeito.” Aí está um
desabafo que não seria possível nos anos 1960. Entretanto, reage com frieza à
desconfiança e mesmo hostilidade que o seu anonimato suscita em Itália: “Como
se o meu gesto de me subtrair fosse um comportamento ofensivo e digno de culpa.”
Clareza desarmante sobre a obra: “Eu escrevo sobre experiências comuns,
dilacerações comuns, e a minha máxima obsessão [é ser] capaz de tirar,
camada após camada, a gaze que enfaixa a ferida, e chegar à história verídica
da chaga.” O princípio não se esgota na epopeia de Elena e Lila. O mesmo
tipo de preocupação matiza o diálogo que estabelece com Mario Martone a
propósito do guião para cinema de Um Estranho Amor. O filme chocou-a,
provocando-lhe “um grande mal-estar”, mas a carta de Maio de 1995,
inacabada e nunca enviada ao realizador, é um dos momentos altos do livro.
Resumindo, Escombros é uma obra
decisiva para entender o fenómeno Elena Ferrante.»
[Eduardo Pitta, do
blogue Da Literatura, 21/12/2016]
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