22.12.16

Sobre Escombros, de Elena Ferrante









«Hoje na Sábado escrevo sobre Escombros, de Elena Ferrante (n. 1943). Chave: “Uma história é antes o precipício das mais diversas experiências, acumuladas ao longo da vida.” Quem o diz é a autora, numa das entrevistas coligidas para a nova edição do livro de 2003 que foi agora reeditado em Itália. (…) Três itens centrais: o direito ao anonimato, a “verdade” em literatura, a defesa intransigente do feminismo. Sobre este último tópico, bem defendido do ponto de vista teórico, faz ouvir uma voz desalinhada: Temo a linearidade das militâncias, em literatura têm um péssimo efeito.” Aí está um desabafo que não seria possível nos anos 1960. Entretanto, reage com frieza à desconfiança e mesmo hostilidade que o seu anonimato suscita em Itália: “Como se o meu gesto de me subtrair fosse um comportamento ofensivo e digno de culpa.” Clareza desarmante sobre a obra: “Eu escrevo sobre experiências comuns, dilacerações comuns, e a minha máxima obsessão [é ser] capaz de tirar, camada após camada, a gaze que enfaixa a ferida, e chegar à história verídica da chaga.” O princípio não se esgota na epopeia de Elena e Lila. O mesmo tipo de preocupação matiza o diálogo que estabelece com Mario Martone a propósito do guião para cinema de Um Estranho Amor. O filme chocou-a, provocando-lhe “um grande mal-estar”, mas a carta de Maio de 1995, inacabada e nunca enviada ao realizador, é um dos momentos altos do livro. Resumindo, Escombros é uma obra decisiva para entender o fenómeno Elena Ferrante.»

[Eduardo Pitta, do blogue Da Literatura, 21/12/2016]

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