«“O fascismo eterno” é, de certa maneira,
pela sua ambição, a “peça de resistência” desta coleção. Começou por ser uma
conferência proferida em inglês nos Estados Unidos e foi publicado em letra
impressa pela primeira vez num jornal literário americano sob o título aqui
conservado – mas em Itália e noutras versões chamou-se ‘Totalitarismo fuzzy e
Ur-fascismo’. O ur-fascismo deste ensaio não é “o fascismo imenso e rubro” da
Alemanha Nacional-Socialista dos anos 30, que fascinou tantos corações juvenis
e cegou até olhos tão límpidos como os do grande escritor francês Robert
Brasillach. O
regime nazi, para Eco, não foi um “fascismo”, foi um totalitarismo, como o
comunismo. Eco não confunde “fascismo” e “totalitarismo”, nem “fascismo” e
“ditadura”. Mas não quer limitar a sua definição de
fascismo ao único “fascismo” histórico. O “fascismo eterno” é, para ele, uma
nebulosa em que se acotovelam e se contradizem culto da tradição, rejeição do
modernismo, medo da diferença, irracionalismo, a obsessão da conspiração, a
“vida pela luta” em vez da “luta pela vida”, o paradoxo de um elitismo de
massas, um culto do heroísmo “habitual” em que “o herói fascista aspira a
morrer” (os bombistas suicidas do Daesh podem com qualquer utilidade ser
considerados heróis “fascistas?”), etc., etc., mas de que também têm um ar de
família o “populismo qualitativo da TV e da internet” – em que a resposta
emotiva de um grupo selecionado de cidadãos pode ser apresentado e aceite como
a “voz do povo” – ou a tirania do “politicamente correcto”. Fascismo e fascista
são termos que perderam qualquer rigor ou utilidade e se transformaram numa
tautologia, numa fraqueza de expressão ou numa arma de arremesso retórica: tudo
o que quem quer que seja considera politicamente nefasto é “fascismo” – tudo o
que é “fascista” é criminoso.» [Miguel Freitas da Costa, Observador,
1-6-2016]
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