«Mas não é apenas no interior da obra de João Miguel
Fernandes Jorge que encontramos boas razões para erguer este livro a um nível
superior. Na verdade ele faz-nos ver os efeitos fecundos de uma enorme
liberdade discursiva, algo em que a poesia portuguesa actual — medida por este
padrão— não é muito pródiga. Aqui, parece não haver nenhum dos constrangimentos
a que obrigam os puritanismos que se manifestam sob as formas crispadas das
várias “ideias” de poesia: não há reduções e unicidades temáticas, há divagação
sem fronteiras; não há uma exposição da primeira pessoa, o Eu apaga-se e é
exclusivamente a imagem que fala, se aceitarmos como válida a ideia de que
estes poemas têm origem no processo que consiste em submeter o visível ao regime
do dizível; e não há arrebatamentos ou lugares de tensão concentrada, nem
fogos-de-artifício de qualquer espécie, porque a música é contínua, subtil, em
baixo tom, mas não monótona. É, aliás, sob o signo da subtileza, da discreta
arte de compor “cenas”, onde o narrativo e o descritivo se conjugam para
alcançar um superior nível de elaboração, que devemos colocar esta poesia.»
[António Guerreiro, Público, ípsilon, 1-5-2015]
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