27.3.24

Sobre A Tempestade, de William Shakespeare

 


«Encontramos, sem dúvida, em A Tempestade algumas características do género literário utópico. A chegada à ilha dos novos habitantes é precedida por um naufrágio — artifício narrativo recorrente na literatura utópica — que evoca, a nível simbólico, o afundamento dos valores da sociedade real; a tempestade permite a ablução dos viajantes de uma vida regida por imagens falsas, sendo o processo de purificação completado pela acção do fogo que atinge a embarcação; e a ilha, a que é habitualmente associada a figura geométrica mais perfeita — o círculo, que não tem quaisquer arestas —, apresenta‑se como um local de encontro com o Outro, privilegiado porque desconhecido e isolado do resto do mundo. Importará, contudo, analisar criticamente estas circunstâncias que aproximam A Tempestade da literatura utópica, e ter em conta pelo menos três aspectos essenciais. O primeiro prende‑se com a comunidade (de três habitantes: Próspero, Miranda e Calibã) que vive na ilha e que se rege por valores iguais aos da sociedade real. Com efeito, mais do que a descoberta de formas alternativas — exequíveis ou não — de organização social — e que, como lembra Krishan Kumar, definem o «modo utópico» —, o que ressalta da peça shakespeariana é a vontade de exploração de percursos humanos de arrependimento e de regeneração moral.» [Da Introdução de Fátima Vieira]


A Tempestade (tradução, introdução e notas de Fátima Vieira) e outras obras de William Shakespeare estão disponíveis em https://relogiodagua.pt/autor/william-shakespeare/

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