31.3.21

Sobre A Íris Selvagem, de Louise Glück

 



«Louise Glück era uma ilustre desconhecida dos leitores portugueses quando, no passado mês de outubro, foi anunciado o Prémio Nobel de Literatura 2020. Porém, a poeta já havia já recebido o Prémio Pulitzer, o National Book Award e o National Book Critics Circle Award, entre outros. A Íris Selvagem é o seu [segundo] livro de poesia editado em Portugal. A questão de “deus” surge com o tema central desta extraordinária obra. Nalguns poemas, a autora interpela diretamente o criador sobre o seu silêncio, a sua ausência, sobre o “vazio do céu” (“Pai inacessível”, “Deixei de me perguntar onde estás”, “Nesta tua longa e prolongada ausência”). Noutros, “deus” assume a voz e contempla, ora com desdém, ora com compaixão, a sua criação (“Minha pobre e inspirada / criação, não passais / de distracção, de meros / epígonos: sois afinal / demasiado diferentes de mim / para me agradar”). Neste contexto, Glück canta o “terror dos filhos de deus”, o desespero da existência (“ser algo é ser quase nada”), a trágica consciência da finitude (“é árduo ser o animal descartável”), o sofrimento de viver neste mundo “exilado do céu”. Contudo, uma luminosa metáfora percorre o livro; o jardim. A paz momentânea através da comunhão com a natureza: árvores, flores, vegetais que se plantam na terra. Talvez a humanidade, como aponta um destes poemas, gaste “demasiado tempo / a olhar adiante” e o exemplo possa estar na flor que pode, simplesmente “florir, sem esperança de viver depois”.»

[Luís Almeida D’Eça, «Sete livros para abraça a primavera», Agenda Cultural de Lisboa, Março 2021.]


A Íris Selvagem e outras obras de Louise Glück estão disponíveis em https://relogiodagua.pt/autor/louise-gluck/

Sem comentários:

Enviar um comentário