«Estamos longe da tendência para “sair da tela” ou de
a tela reproduzir a vida. Quando se dizia, classicamente, de um pintor que ele
conseguia que o espectador “entrasse” nos seus quadros (como Kandinsky, nas
suas memórias, descrevendo o seu sentimento, na infância, de ter uma impressão
tão profunda da cena pintada que lhe parecia penetrar e percorrer as ruas do
quadro como se fossem reais), evocava-se tanto o poder de ser afectado do
espectador como o de afectar do pintor. E supunha-se que o quadro se reduzia à
imagem finita, contida dentro de limites geométricos precisos, na superfície
bidimensional da tela. Raramente se considerava o “sair da tela” das forças do
quadro que se desdobravam no espaço para além da área pintada. O quadro consistia naquela superfície; tudo o que
a ultrapassava era da ordem da ilusão, da alucinação.
(…) Porque não existe um espaço pictural plano, porque
a pintura projecta imediatamente as linhas e figuras no ar, para cá e para lá
da tela — uma cor cria logo um volume que sai do fundo branco —, Ângelo (de
Sousa) foi levado a construir um plano flutuante, próprio do desenho,
que foge à superfície bidimensional.»
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