«Creio que Debaixo do Vulcão poderá ser um livro realmente bom: poderá sê-lo, é a ameaça que faço, afirmou Malcolm Lowry numa das primeiras cartas que escreveu ao seu agente literário Harold Matson, em Julho de 1940. Lowry acabara de se instalar numa cabana na praia de Dollerton, perto de Vancouver, na Colúmbia Britânica, e trabalhava numa nova versão do romance que tinha concebido e escrito pela primeira vez no México, país a que havia chegado no Dia dos Mortos de 1936.
De início o romance foi descaradamente autobiográfico, fruto e reflexo do México e das experiências que aí teve, desde os decadentes jardins de Cuernavaca e as cantinas onde podia afogar-se em mescal apenas por alguns pesos, até ao terrível episódio da prisão e ao delirium tremens em Oaxaca, depois de ter sido abandonado pela mulher. Uma descida aos infernos fielmente registada no primeiro Manuscrito, porque mesmo nos seus piores momentos, Lowry nunca renunciou a escrever, a reflectir sobre o papel a incrível realidade.
“Podia dizer-se que era como um registador”, afirmou o escritor e poeta americano Conrad Aiken, que visitou Lowry durante a sua estada em Cuernavaca, declarando depois que “o romance estava essencialmente pronto em Julho de 1937” e concluindo que “o livro iria ser reescrito durante os próximos nove anos”. Não é de estranhar, dado o seu génio para a linguagem, que se convertesse nesse milagre da prosa inglesa que, em minha opinião, é o seu melhor conseguimento.
Efectivamente, no seu paraíso privado de Dollerton “entre o bosque e o mar”, Lowry reescreveu uma e outra vez o Manuscrito, construindo o seu romance como quem compõe uma sinfonia, introduzindo novas formas e desenvolvendo as existentes num jogo contrapontístico de secretas correspondências e sugestivas alusões poéticas.
Ao fim de nove anos, a sua experiência mexicana havia-se transformado num monumento barroco de profundas ressonâncias simbólicas (…).» [Carmen Virgili]
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