«Há que saber escutar o silêncio para ler “Um Bailarino na Batalha”. Nas primeiras três páginas, o texto é só respiração e ritmo — ouve-se o rumor antes do início, mas estamos in media res, pois todo o acontecimento lhe é já anterior, enquanto movimento encantatório, anunciado previamente na cadência da epígrafe-canto-ditirambo, de Nietzsche (cuja primorosa tradução nos entrega, em uníssono, a dádiva do significado e o ritmo do seu andar). Pedra contra pedra, areia, deserto, morte. Ou morte, deserto, pedra contra pedra — movimentos circulares de morte e regeneração. Uma coreografia de sinais. Só depois surgem os caminhantes, a inventar o tempo e a memória, para que não haja esquecimento e a pedra se ligue ao voo: “Pesados como pedras, no entanto velozes como pedras, eles caminham,os últimos errantes, uns poucos dias mais adiante, os poucos dias que os separam da música dos ossos” (11). Quem lê ainda não pergunta, nem vontade tem de perguntar. A cena abre-se aos olhos e vive por si. Como a imagem de Akram Khan na capa do livro, retirada do cartaz do seu solo Xenos (estreado em Atenas em 21/2/18) e tão cara a Hélia Correia, que diz ter visto nesse corpo o seu bailarino na batalha. No entanto, como afirma numa entrevista, para si, a imagem do bailarino na batalha é o cavalo, o único capaz de transcender aquela realidade [.]» [Maria Etelvina Santos, Colóquio Letras, 201, Maio/Agosto 2019]
Obras de Hélia Correia disponíveis no sítio da Relógio D’Água.
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