«Como chegámos aqui
É esse o núcleo do livro. Se ele tem um destinatário principal é o leitor ocidental perante um mundo em “tumulto”. Como chegámos aqui? “Um dos meus desafios foi o de ser justo com o que acontece quando pessoas, quase sempre homens, lutam pelo poder ou pelo dinheiro, ou pelo statu, e perceber como as decisões são tomadas. Explicar as motivações das pessoas é uma tarefa dos historiadores; ajuda e é a única maneira de escrever de forma objectiva”, esclarece, escolhendo como ponto de partida para esta viagem através tempo o modo como ele se manifestou no espaço. Desde a imagem idílica do Jardim do Éden, próximo dos territórios entre os rios Tigre e Eufrates, a ponte entre Oriente e Ocidente onde se estabeleceram as primeiras grandes cidades do mundo há cerca de cinco mil anos. Ali estavam Harapa e Mohenjo-Daro, e depois a Babilónia, Nínive, Uruk e Acádia. A Mesopotâmia. Aí nasceriam ou iriam cruzar-se as grandes religiões do mundo, o judaísmo, o cristianismo, o budismo, o islamismo, o hinduísmo. Escreve Frankopan: “Foi esse o cadinho onde as famílias linguísticas competiram entre si, onde as línguas indo-europeias, semíticas e sino-tibetanas acompanhavam os falantes de altaico, turcomano e caucasiano. Foi aqui que os grandes impérios nasceram e caíram, onde os efeitos de disputas entre culturas rivais se sentiam a milhares de quilómetros de distância. Esta posição geográfica abria novas perspectivas do passado e mostrava um mundo profundamente interligado, onde o que acontecia num continente tinha impacto noutro…”
A globalização não é assim tão recente, quer evidenciar Frankopan. Difunde-se riqueza e violência, conhecimento e escravatura e a cruzada — uma das palavras mais analisadas no livro pela carga ambígua — é sempre a mesma. “A cruzada é sempre pelo dinheiro, pelo poder, pelos recursos. Foi sempre assim, mesmo que se usem outros argumentos, se diga que é pela justiça, por uma fé”, afirma, e — diz — continua a ser assim agora que se ouve a palavra ressurgir. “É sempre uma civilização a tentar impor-se a outra, e essa imposição implica sempre força, implica sempre violência”, continua o historiador.
Dito isto, as rotas da seda de que fala o título não são mais nem menos do que as estradas, as artérias, os caminhos por onde circulam mercadorias, exércitos, pessoas, doenças, ideias, religiões, modas e gastronomia ao longo dos tempos e que servem a Frankopan para sair da visão eurocêntrica do mundo. Um mundo enquanto organismo vivo e em permanente mutação. “Seremos capazes de nos adaptar?” É sempre a dúvida subjacente ao longo do livro e a da conversa como quando, por exemplo, Frankopan refere a nova ordem mundial.» [Público, ípsilon, 9/9/2018. Entrevista completa aqui.]
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