«Em que mudaram os tempos? Nisto, para abreviar a especulação em torno do intelectual: o sentimento da tragédia perdeu terreno, e daí parte todo o delírio de persuasão a favor duma vida exausta e acumulada de mesteres remunerados apenas conforme a sua produção material. Um homem não é uma incógnita de medos e de vocações insubstituíveis, mas algo que não resistirá a uma liberdade instaurada em nome do possível. O papel do artista é o de reformar o mito do impossível e o de criar a tragédia. Como se desempenha ele da sua missão, raramente o podemos ver com os nossos próprios olhos; serão outros que tomarão contacto com aquilo que fez a consciência subterrânea da sua época. Através dos amores narrados com desvairada frieza, através dos crimes melancólicos e das brutalidades que o instinto não sugeriu, através das suas desordens que mal apagam a culpa pelo que já foi vivido e perdido antes, noutras idades e noutras criaturas, dar‑se‑á o encontro com a tragédia. A Europa conhece‑a ainda, não perdeu de vista a sua face pálida, o seu esgar de espanto, a sua garra branca e petrificada.» [Do Prefácio]
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