«Ao mesmo tempo que existem estas crises entre as personagens, encontramos neste romance uma descrição constante dos efeitos desgastantes do tempo nos objectos, nos edifícios e nas próprias pessoas: “Vivo em Roma, sei reconhecer a ruína.” (página 250). O tempo serve como uma testemunha da atividade humana, um observador omnipotente das suas ruínas, manchas e obsessões. Ao contrário das tragédias gregas, não temos aqui determinismo estruturante que condena as personagens a um castigo divino e superior. Temos antes, personagens mais modernas, mais cientes de uma limitação profunda da natureza humana, que nunca cedem a considerações divinas ou metafísicas, mas agarram-se a uma simples tentativa de sobrevivência, como que assombrados em relação à sua própria existência. As personagens são descritas como se fossem peões que tentam sobreviver jogada a jogada, privilegiando os seus instintos, sem nunca verdadeiramente tentarem alcançar uma qualquer forma de liberdade.
Uma das razões pela qual a prosa de H.G. Cancela tem um teor de grande densidade e de tensão narrativa deve-se ao facto de as suas personagens andarem em deriva pelo mundo, presas a actos repetitivos, não conseguindo escapar de si mesmas ou do seu passado. Em As Pessoas do Drama está ainda presente uma descrição de uma componente biológica, hereditária, da animalidade presente no ser humano que adensa um sentimento de culpa.» [Jorge Ferreirinha Antunes, Revista Intro, 12/7/18. O texto completo pode ser lido aqui: http://www.intro.pt/as-pessoas-do-drama-h-g-cancela-relogio-dagua-2017/ ]
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