7.3.18

Sobre «Memórias do Subterrâneo», de Fiódor Dostoievski






«“Memórias do Subterrâneo” compõe-se de duas partes, com o mesmo narrador: a I parte, “O subterrâneo”, é um ensaio/panfleto sob a forma de monólogo torrencial e febril, que ataca ferozmente as concepções estritamente racionais, utilitárias e colectivistas de Chernyshevsky e faz o elogio do indivíduo e do livre-arbítrio. A II parte, “Por causa da neve húmida”, diz respeito a três episódios da juventude do narrador, mas embora neles sejam detectáveis os temas do monólogo, a personagem do narrador dá mostras de uma pusilanimidade, inconstância, hipocrisia, frouxidão de carácter, autocomiseração e hipocrisia que contrastam com o tom de determinação do “eu” 15 anos mais velho que profere o monólogo. As insensatas acções que esta personagem empreende na II parte pretendem representar o primado do livre-arbítrio e a rejeição de uma vida calculista, mas Dostoievsky carregou de tal forma as tintas (“estão aqui de propósito reunidos todos os traços de um anti-herói”) que acabam por ser sinal de capricho, desvario e histeria.» [José Carlos Fernandes, Time Out Lisboa, 14/2/2018]

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