18.12.17

Sobre Pequenos Delírios Domésticos, de Ana Margarida de Carvalho




«O primeiro, uma ferroada irónica na atmosfera húmida dos Açores, é um conto perfeito narrado à século XXI, muito diferente da estrutura do conto clássico. Atmosfera natural, ambiente social, vida individual de Jaime, obstáculo ao desenrolar da narrativa, pedido extemporâneo, acaso (o computador esquecido ou roubado), final insólito (não sintetizamos os contos para não tirar ao leitor o prazer de os ler).
O segundo, “Como ela em triste céu”, um dos mais delirantes mas realista dos contos “domésticos”, um cruzamento doentio entre dedos hiperativos, com vontade própria, e objetos a caírem do céu, reproduzindo, na imaginação enferma de um adulto, o ambiente de guerra vivido na infância (bombas, morteiros, minas terrestres, cocktails molotov).
Finalmente, o terceiro, talvez o melhor conto, “Última Ceia”, desenha um ambiente perfeito ao modo de AMC: claustrofobia familiar, família atípica com genealogia anómala (pares de gémeos) e casa anormal, marginalidade social, ambiente de abjeção em contraste com a burguesia típica, institucional, passiva e obediente (Mateus), sobrevalorização de sentimentos negativos das personagens, inclusive de animais (gata zarolha), final insólito mas bem estruturado.

Se Ana Margarida de Carvalho venceu a montanha do romance, como os prémios o comprovam, venceu igualmente a colina dos contos. “Pequenos Delírios Domésticos” é a comprovação.» [Miguel Real, JL, 6/12/17]

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