«ENTRADA
Distâncias
somavam a gente para menos. Nossa
morada estava
tão perto do abandono que dava atépara a gente pegar nele. Eu conversava bobagens
profundas com os sapos, com as águas e com as
árvores. Meu avô abastecia a solidão. A natureza
avançava nas minhas palavras tipo assim: O dia
está frondoso em borboletas. No amanhecer o sol
põe glórias no meu olho. O cinzento da tarde me
empobrece. E o rio encosta as margens na minha voz.
Essa fusão com a natureza tirava de mim a liberdade
de pensar. Eu queria que as garças me sonhassem.
Eu queria que as palavras me gorjeassem. Então
comecei a fazer desenhos verbais de imagens. Me dei
bem. Perdoem‑me
os leitores desta entrada mas vou
copiar de mim alguns desenhos verbais que fiz para
este livro. Acho-os
como os impossíveis verossímeis
de nosso mestre Aristóteles. Dou quatro exemplos:
1) É nos loucos que grassam luarais; 2) Eu queria
crescer pra passarinho; 3) Sapo é um pedaço de chão
que pula; 4) Poesia é a infância da língua. Sei que os
meus desenhos verbais nada significam. Nada. Mas
se o nada desaparecer a poesia acaba. Eu sei. Sobre
o nada eu tenho profundidades.»
Sem comentários:
Enviar um comentário