«No sentido que Montaigne lhe deu, o ensaio é uma aproximação a um
tema. Ao contrário da posterior versão académica, ele não se pretende impessoal,
valendo justamente por nos fazer sentir a voz do seu autor. Quando Orwell
descreve as ilusões de H. G. Wells sobre um futuro governo mundial, facilmente
ouvimos o socialista que adquiriu consciência aguda daquilo que
prioritariamente move os povos. Não qualquer impulso da solidariedade
universal, mas o nacionalismo, um fenómeno cuja análise e tipologia são feitas
num ensaio posterior.
A outro nível, as considerações de Orwell a propósito dos primeiros
poemas de Eliot são um modelo de bom senso: “A consciência da inutilidade de
tudo é feita unicamente para os jovens. Não se pode viver no ‘desespero’ até à
velhice. Não se pode ser ‘decadente’ a vida toda, porque decadência significa
queda, e só se pode dizer que alguém está em queda se for chegar ao fundo
razoavelmente depressa.” Até a explicação da resistência de Tolstoi a
Shakespeare consegue descer a um nível relativamente simples de interpretação
psicológica (“Tolstoi não podia ter paciência para um escritor caótico, divagante
e amigo de minudências como Shakespeare.. A sua reação é a de um velhote irascível
importunado por uma criança barulhenta”) sem por isso se tornar banal ou
implausível. Estas amostras dão ideia da diversidade de temas tratados neste
livro.» [Luís M. Faria, Expresso, E, 11/6/2016]
Sem comentários:
Enviar um comentário