16.12.15

Sobre Elena Ferrante





«A literatura  já tratou todos estes temas, mas Ferrante parecia trazer uma linguagem nova para dizer tudo isto. Lidas hoje, estas ficções publicadas em Portugal na primavera de 2014 com o título Crónicas do Mal de Amor parecem um laboratório para o que aí viria. Ressurgem com novo fôlego na saga que começou em 2011, com a publicação em italiano de A Amiga Genial, início de percurso de Lenù e Lila, de um laborioso trabalho que mistura o que há de mais comezinho na existência com as grandes questões que sempre ocuparam os romancistas: amor, morte, traição, vingança, identidade. James Wood escreveu assim sobre o trabalho de Ferrante: “o material visitado e revisitado pelos primeiros romances é íntimo e muitas vezes surpreendentemente cândido: maus-tratos a crianças, divórcio, maternidade, querer e não querer filhos, o tédio do sexo, as repulsas do corpo, a luta desesperada da narradora para conservar uma identidade em coesão com um casamento tradicional e com as sérias responsabilidades de criar os filhos. Os romances apresentam-se  […] como anamneses, cheios de raiva ardente, lapso, malogro e um ténue sucesso psíquico. Mas trata-se de anamneses ficcionais. Compreende-se que Ferrante não tem qualquer interesse em juntar a sua privacidade à pira dos romances.”
O texto de Wood, relembre-se, é de 2013, um ano depois de começar a publicação em inglês da série de Nápoles, um ano depois de o fenómeno ter disparado, muito graças a este mesmo texto. Cair nas graças de Wood é meio caminho e não faltaram vozes a dizer que era só isso: Wood a criar mais um “caso sério”. Mas terá Wood tanto poder? Num artigo mais recente publicado no Guardian, a jornalista Deborah Orr dizia simplesmente isto: “Não conhecemos Elena Ferrante — é exatamente por isso que o seu sucesso é tão maravilhoso.” Nada disto é, por si só, suficiente para explicar por que se gosta de Elena Ferrante e se sente como familiar o que ela escreve mesmo que a milhas da realidade de cada um dos leitores. Como se explicará não podendo explicar-se, para já, pela biografia da autora?» [Isabel Lucas, Ler, Inverno de 2015]

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