Maria Leonor
Nunes entrevistou Hélia Correia para o último número do JL a propósito do
Prémio Camões.
«Que significado
tem para si este Prémio Camões?
Hélia Correia: É
uma dádiva bonita, que recebo com gratidão. Mas sinto-me envergonhada, como uma
menina que fosse chamada à tribuna e tivesse de atravessar uma sala com toda a
gente a olhar para ela… (risos) E sinceramente muito deslocada.
Porquê?
Porque não sinto
que tenha uma obra consistente. A minha vida é feita livro a livro, sem visão
de conjunto, enquanto há outros grandes escritores vivos de língua portuguesa
com aquilo a que se pode chamar “uma obra”. Isso deixou-me muito aflita. Mas
pessoas importantes na minha vida não acharam graça nenhuma ao modo como reagi à
notícia do prémio, quando disse isso mesmo, e têm ralhado comigo. Até acham que
fui indelicada para os membros do júri, a última coisa que queria, porque
conheço e admiro muito alguns deles, como o Mia Couto e o Pedro Mexia. Sou uma
pessoa sem inteligência social. Instintivamente não sei lidar com a sociedade,
nunca aprendi, nem quis…
Em compensação,
tem uma grande inteligência emocional?
A minha vida é
100% determinada pelo afeto, a todos os níveis, o que em algumas circunstâncias
pode ser desastroso. Deviam dar-me algum tempo para que essas pessoas amigas me
ensinassem como reagir a um grande prémio como este.» [JL, 24-6-2015]
O jornal divulgou
ainda quatro sonetos gregos inéditos de Hélia Correia. Além disso, o jornal publicou
um ensaio de Rita Taborda Duarte:
«O universo
literário de Hélia Correia é densamente reflexivo e humanista e nele
reconhece-se uma sabedoria antiga. (…) Aliás, não tivesse um dia Hélia Correia
afirmado [em entrevista a Ana Marques Gastão] que a “escrita é feita para
derrubar o anjo e levantar o humano, é um elevador para a arrogância. A arrogância
é o que dá luz aos mortais. Os próprios deuses aprenderam a escrever pela mão
dos profetas, admitindo que lhes faltava aquela competência» [JL, 24-6-2015]
Na revista E
do Expresso de 27 de Junho, Hélia Correia foi escolhida para a rubrica
«Oito da Manhã»:
«“Acordar às oito
horas? Mas eu não pertenço a esse planeta! Não me levanto antes do meio-dia. A
noite é vivida até muito tarde…” O tempo é algo de relativo. Reage: “Nem
relativo. É completamente exterior em mim.” Quando é que começou essa prática
de dispensar as “matinas”? “Na escola primária só ia às aulas após o intervalo
da manhã, nunca mais cedo. A professora era extraordinária e como eu já sabia
escrever e ler bem, facilitou, condescendente.” De Hélia, apesar de aqui
fotografada em Lisboa, é fácil lembrarmo-nos quase como de uma fada no meio do
bosque, esse sim, o “seu planeta”. Ali fluem a natureza e seus sortilégios. “Há
outro tempo, não o dos relógios, mas o que é concebido para que determinados
fenómenos aconteçam naquele momento.”»
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