No número de Dezembro da revista Ler, José Mário Silva escreve
sobre The Narrow Road to the Deep North, do australiano Richard
Flanagan, vencedor do Man Booker Prize 2014.
«Os temas centrais deste romance são dois tópicos literários por
excelência: a guerra e o amor. Flanagan encontrou um modo subtil de os cruzar,
mas o que torna The Narrow Road to the Deep North memorável é a sua
descrição vívida dos tormentos por que passaram os POW (prisioners of war)
australianos nas selvas da Indochina, às mãos dos japoneses, durante a
construção da infame “ferrovia da morte”, um troço de 415 quilómetros que
ligava Sião (actual Tailândia) à Birmânia (actual Myanmar). O objectivo era
abrir uma via para o transporte de material e tropas, com vista a um ataque à
Índia que nunca se concretizou. Sem dinheiro nem maquinaria apropriada, os
japoneses avançaram na mesma, para cumprir o desígnio do imperador,
sacrificando de formas inimagináveis os prisioneiros, transformados em mão-de-obra escrava.
As estimativas variam muito, mas até à conclusão da linha, em 1943, terão
morrido entre 80 mil e 200 mil homens. Dos 22 mil POW australianos, na maioria
capturados após a queda de Singapura, um terço perdeu a vida no inferno verde
da selva birmanesa. (…)
O segundo eixo essencial, subtilmente encaixado no da guerra, é a
história de amor entre Dorrigo e Amy, a mulher do seu tio. Uma história
condenada por duas mentiras simétricas – sabiamente geridas pela exemplar
economia narrativa do romance (a pedir uma mais do que previsível adaptação
cinematográfica) –, e responsáveis por uma tragédia íntima, contraponto da tragédia
colectiva de que Evans se tornou um símbolo. Nas páginas iniciais, um
personagem afirma que um “bom livro” deixa no leitor “a vontade de o reler”. É
o caso deste.»
A obra será editada em finais de Fevereiro pela Relógio D’Água.
Sem comentários:
Enviar um comentário