9.4.21

Sobre «A Polícia da Memória», de Yoko Ogawa

 

«Numa ilha sem nome, em certas manhãs, há objectos que começam a desaparecer: pássaros, chapéus, perfumes, rosas… Uma força desconhecida faz com que as pessoas “esqueçam” esses objectos colectivamente. (Esse esquecimento será levado ao extremo quando também partes do corpo deixarem de ser sentidas.) Os agentes da Polícia da Memória impõem a retirada da ilha de todas essas coisas, assim como das pessoas que ainda se continuem a lembrar delas, a função é fazer cumprir os desaparecimentos. “A ilha é governada por homens determinados a que tudo desapareça. Do ponto de vista deles, é inconcebível que qualquer coisa não desapareça quando eles assim decidem. Por isso obrigam-na a desaparecer com as suas próprias mãos.” É neste ambiente, que de imediato nos leva a Orwell e também a Kafka, que decorre a trama do romance “A Polícia da Memória” (originalmente publicado em 1994) — o livro, traduzido para inglês há dois anos, foi finalista do International Booker Prize.
Esta fábula japonesa, que a uma primeira leitura poderá ser vista como uma meditação política sobre o totalitarismo e a resistência (mas como se verá adiante, poderão ser feitas ainda outras leituras menos políticas), não se refere a um tempo em particular (apesar de os objectos nos remeterem para um tempo actual), ou a um certo regime político, mas é algo que poderá ser lido como a história das pessoas que em diferentes lugares e em diferentes tempos foram desistindo de lutar conta o que lhes foi sendo imposto.
(…)
Qualquer que seja a leitura que se faça, este magistral e sóbrio romance de Yoko Ogawa é um brilhante exercício sobre a necessidade de prevalência da memória, do poder que esta tem para a sobrevivência da verdade.»

[José Riço Direitinho, «A alienação de se estar vivo», «Ípsilon», 2021/04/09]

«A Polícia da Memória», de Yoko Ogawa, com tradução de Inês Dias, está disponível em: https://relogiodagua.pt/produto/a-policia-da-memoria/


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