30.4.19

Sobre Kudos, de Rachel Cusk




«Precisa e brilhante, Rachel Cusk encerra a trilogia iniciada com A Contraluz e Trânsito. Narrativas dentro de narrativas e personagens à conversa.


Quando deparamos pela primeira vez com Faye, a personagem central da trilogia romanesca de Rachel Cusk (formada por A Contraluz e Trânsito e Kudos), sabemos pouquíssimo sobre ela. Quase nada. É uma escritora, mãe de dois rapazes, recentemente divorciada e ainda a lidar com o impacto emocional da súbita desestruturação da sua vida. No fim dos três romances, não sabemos muito mais. Ela atravessa os romances como uma presença ausente, um fantasma, um mero catalisador das histórias alheias. O que nos conta é o que ouve. E ela ouve tudo. Na sua presença, os outros entregam-se a confidências e desabafos. Podemos suspeitar que Faye perdeu algo, talvez o essencial, mas Cusk nunca nos diz quanto, nem como, nem porquê. Eis, em todo o seu esplendor, uma radical estratégia de apagamento. Quanto mais reflete os outros, menos se revela. No fundo, estamos diante de uma corajosa e original tentativa de reinventar a forma do romance clássico. Como? Pela abolição das suas categorias mais reconhecíveis, nomeadamente a trama. Nenhum dos três romances permite sequer o conforto de uma sinopse. Porque não há propriamente capítulos, ou cenas, apenas uma sucessão de encontros.» [José Mário Silva, E, Expresso, 27/04/2019]

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