7.12.18

Agustina, a primeira mulher distinguida com Honoris Causa na UTAD




«O Ano Agustina culminou com a entrega à escritora do titulo Honoris Causa da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro. Marcelo Rebelo de Sousa comparou-a a um majestoso rio.


“Dar valor a quem o tem enobrece mais quem reconhece do que quem é reconhecido. E por maioria de razão quando, em vez de valor, estamos a falar de génio”, afirmou o Presidente da República, numa mensagem que enviou à Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD), na sexta-feira, por ocasião da atribuição à escritora do título de doutor Honoris Causa. Foi o encerrar do Ano Agustina, que partiu de uma ideia de José Silva Peneda, Presidente do Conselho Geral da Universidade (…) e foi depois pensado, organizado e concretizado por um grupo de Professores da UTAD, com o apoio do Círculo Literário Agustina Bessa-Luís. Homenagear a escritora que durante toda a sua vida literária escreveu sobre aqueles lugares, fazendo dessa homenagem uma alavanca científica para a própria universidade era um dos objetivos.
O Ano Agustina culminou com o Colóquio Internacional “Toda eu sou Actividade — obras, relações, sentimentos”, que decorreu nos dias 22 e 23 e onde se reuniram vários pensadores da obra da artista, como Maria Filomena Molder, Álvaro Manuel Machado, Hélia Correia, António Preto, Guillaume Bourgois, entre outros. Em foco as diferentes facetas da escritora, como romancista, jornalista, a sua relação com o cinema, com a História, com a representação do feminino mas, sobretudo, a sua genialidade iconoclasta, a sua ironia, a sua milagrosa sabedoria. Foi ainda apresentada a reedição, pela Relógio d’ Água, do livro As Estações da Vida (com prefácio de António Barreto), um livro excêntrico à restante obra de Agustina, uma travessia nos comboios da linha do Douro, os seus painéis de azulejos, as memórias de uma infância e de um país, que Mónica Baldaque apresenta assim:



‘As Estações da Vida’ é uma joia que apetece guardar num estojo de veludo, como uma joia de família. O António Barreto, porque lhe corre o mesmo sangue de Agustina, um sangue com terra daqueles montes, água daqueles rios, fumo das queimadas das vides, percebeu o texto como ninguém, no prefácio que escreveu para esta edição.É uma conversa sem interlocutor, é uma oração aos sinais de um quotidiano, que constroem caminhos, pontes, esperanças, belas ruínas, eternas.

O Colóquio tinha por mote uma frase de Agustina encontrada numa carta a José Régio, de 12 de março de 1960: “Eu dirijo-me sempre aos tíbios, quero sacudi-los, quero despertá-los— e se alguém de alma delicada me escuta pode cuidar que me alegro em ferir e que me divirto em provocar. Não é isso. Os meus gritos e ranger de dentes não são com criaturas que em si próprias estudam o caminho; são com os que vivem glutonamente no campo da morte, são com os sãos e com os hipócritas”. Assim, o “caminho” pela obra de Agustina Bessa-Luís esteve a cargo da escritora Hélia Correia que comoveu um auditório cheio de alunos, docentes e admiradores e estudiosos ao falar da “Improbabilidade de Agustina”, do espanto, do milagre e do terror desse “diabo de mulher” que escreve como se nunca fizesse qualquer esforço, como se todo aquele caudal de ideias, sabedoria, palavras, frases onde o mundo e a humanidade encontram a sua representação perfeita o que nos faz duvidar se Agustina realmente existe ou se é uma invenção da nossa imaginação coletiva.

Em destaque no colóquio esteve ainda o menos conhecido (e reconhecido) trabalho de Agustina como jornalista. Ao longo de 56 anos a escritora colaborou em múltiplos jornais e revistas, fazendo da crónica o seu trabalho literário mais constante logo a seguir ao romance. Em 2016, todos os artigos foram reunidos por Lourença Baldaque e publicados em três grandes volumes, pela Fundação Gulbenkian, sob o titulo Ensaios e Artigos: 1951-2007.»


[Joana Emídio Marques, Observador, 29/11/2018. Texto completo aqui ; fotografia: Mónica Baldaque, representando Agustina Bessa-Luís na cerimónia na UTAD]

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