20.4.25

De Paul Celan

 «CORONA


À minha mão vem o Outono comer suas folhas: somos amigos. Descascamos o tempo das nozes e ensinamo‐lo a partir:

o tempo retorna à casca.


No espelho é domingo,

no sonho dorme‐se,

a boca diz a verdade.


O meu olho desce até ao sexo da amada: olhamo‐nos,

dizemo‐nos algo sombrio,

amamo‐nos como papoila e memória,

dormimos como vinho nas conchas,

como o mar no jorro‐sangue da Lua.


Estamos abraçados à janela, vêem‐nos da rua:

chegou a altura de se saber!

Chegou a altura de a pedra se dignar em florir,

de o coração do desassossego começar a bater.

Chegou a altura de ser altura.


Chegou a altura.»

[p. 19, de Não Sabemos mesmo O Que Importa, de Paul Celan, trad. Gilda Lopes Encarnação]


Não Sabemos mesmo O Que Importa (trad. e posfácio de Gilda Lopes Encarnação) e outras obras de Paul Celan estão disponíveis em https://www.relogiodagua.pt/autor/paul-celan/


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