6.12.19

Marlon James em entrevista a Isabel Lucas, a propósito de Leopardo Negro, Lobo Vermelho, que a Relógio D’Água acaba de publicar





«Com Breve História de Sete Assassinatos, foi-nos apresentado como um dos autores mais ousados da actual geração que escreve em inglês. Mas o último, Leopardo Negro, Lobo Vermelho, talvez seja o mais arrojado. É outro épico, mas mais fantasioso

IL — Leopardo Negro, Lobo Vermelho é uma fantasia, o seu primeiro romance fantástico num território geográfico que não +é originalmente o seu: o continente africano…
MJ — Cresci com a fantasia europeia, que adoro. Cresci com elfos e contos de fadas e bruxas e duendes, com Robin dos Bosques e Tolkien. Para mim, a ideia de fantasia era uma ideia europeia, ou, de forma mais ampla, árabe, sobretudo por causa das Mil e Uma Noites. Cheguei a pensar que todo o meu vocabulário de fantasia era europeu. Mas para contar este tipo de história precisava de uma linguagem nova e de um mundo novo.
[…]
IL — E enquanto escritor pode escolher criar um mundo ou representar o mundo… Escolheu ser um inventor?
MJ — Sim. Quis criar um puro romance de fantasia, quis magia, bruxas, monstros, reinos magníficos, mas derivar daí, ir para tantos lugares africanos quanto possível; li muito sobre as crianças mingi na Etiópia, por exemplo, e um dos meus reinos, Dolingo, foi baseado em Timbuktu [Tungubutu] e outro em lugares mágicos.
Estamos sempre a desafiar e a alterar a realidade. Na literatura americana há uma fixação enorme com o realismo social enquanto símbolo de literatura evoluída. A maioria dos escritores desse realismo social são homens brancos, que escrevem sobre homens brancos; quando as mulheres existem, é enquanto personagens secundárias desses homens brancos; ninguém trabalha; toda a gente está muito ocupada a ter longos tédios existenciais, mas todos sabemos que a contas têm de ser pagas, as crianças têm de ir para a escola; a vida real acontece. […] O realismo, tal como o definimos, na verdade é muito pouco real. Ou é real para uma minoria de pessoas. Há uma ausência de diversidade nesses romances. Podemos ler dez romances realistas sem encontrar uma pessoa negra e boa sorte se encontrarem uma mulher que seja responsável pela sua vida, a não ser numa ficção realista escrita por uma mulher. Quis desafiar isso, porque há verdades que as mitologias nos contam.» [Entrevista de Isabel Lucas a Marlon James, ípsilon, Público, 6/12/2019]




Leopardo Negro, Lobo Vermelho e Breve História de Sete Assassinatos (traduções de José Miguel Silva) estão disponíveis em https://relogiodagua.pt/autor/marlon-james/

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