27.4.17

Marlon James em entrevista




«Não há silêncio em Breve História de Sete Assassinatos, romance que valeu o booker a Marlon James. É uma escrita dura, crua, política porque não pode ser de outra forma quando sair de quem cresceu no medo, na Jamaica dos anos 70 e 80. Numa conversa a partir de Minneapolis, onde vive, o escritor pede que não procurem a sua biografia neste livro e lamenta não ter podido votar na América.

O sorriso não é uma expressão frequente no rosto de Marlon James. Há um misto de serenidade e inquietude no modo como se ajeita na cadeira, escuta as palavras, ou fala, ajeitando as mechas da sua longa cabeleira rasta. Tem os braços apoiados na secretária, um computador `ªa frente e uma caneca que leva à boca enquanto ouve o interlocutor num início de conversa feita por Skype. É para quebra gelo: “Confessou ao Guardian ser um nerd e a revista Rolling Stone chama-lhe rebelde. Quem é,. afinal, Marlon James?” Sorri então abertamente, pousa a caneca e responde: “Continuo um nerd, mas não sei nada de rebelde.”
Socialmente desajeitado — ou melhor, desinteressado —, o vencedor do Man Booker Prize em 2015 diz que continua solitariamente a ler, “a investigar temas sem qualquer aplicação prática”, a interessar-se “por coisas pelas quais a maior parte das pessoas não se interessa”, a “idolatrar” os seus autores, Gabriel García Márquez, William Shakespeare, Charles Dickens, Toni Morrison, José Saramago, escritores que lhe ensinaram as bases e também a “subversão de regras” na literatura, que o romance não tem de ser escrito segundo os mandamentos vitorianos que foram a base da sua educação literária. “continuo a achar que essa é a minha herança, a do romance vitoriano, mas o que me interessa autor é poder inovar a partir daí.” Mas um nerd sobretudo por tentar fazer o que lhe dá prazer “sem pensar na aprovação ou na utilidade” desses atos, mesmo que isso o afaste dos outros. Conta que em miúdo passava horas a ler e a desenhar e era um desastre nos desportos, o que lhe valia a reprovação dos colegas de escola. Chamavam-lhe ofensivamente… nerd. Ri. “Isso não me fez mudar porque há em mim, como em toda a minha família, uma espécie de necessidade de reinvenção que se calhar vem dessa ‘nerdice’”, ou seja, por tentar fazer o que lhes dá exaltação. “O meu pai tem mudado de profissão toda a vida. recentemente decidiu tornar-se juiz. E eu também não estou onde estavam, mas continuo um nerd.”» [Entrevista de Isabel Lucas, Ler, Primavera 2017]

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