«Uma vez admitida a noção de “vida
heteronímica”, trata-se então de explorar todo um campo que até agora mereceu
pouca atenção. Múltiplas questões nascem, cuja sondagem se revela pertinente
para a compreensão de tal e tal heterónimo. Por exemplo, porque é que Fernando
Pessoa faz morrer Caeiro e mais nenhum heterónimo? Ou: como caracterizar o
corpo de Caeiro a que o poeta neopagão se refere constantemente? A estas
perguntas, os dois primeiros ensaios deste livro procuram responder. Mas
inúmeras outras pedem resposta: porque é que Álvaro de Campos interfere na
relação amorosa de Fernando Pessoa e Ofélia (quando nenhuma relação desse tipo
se vislumbra na obra do engenheiro naval)? Porque é que o patrão Vasques se
destaca no deserto da paisagem humana do Livro do Desassossego? (…)
Este conjunto de textos divide-se em duas partes: na primeira,
explora-se uma
ínfima área da “vida heteronímica” formada por “acontecimentos e elementos”
reais dessa vida, no caso exclusivo de Alberto Caeiro. Na segunda parte, o
campo analisado remete para os mecanismos de construção da “subjectividade”
heteronímica (estendendo-a ao teatro); e para o mapa — a traçar, em toda a sua
complexidade — dos afectos que atravessam o Livro do Desassossego e o
corpo de Bernardo Soares.» [Da Nota Prévia]
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