10.8.21

Sobre «As Pequenas Virtudes», de Natalia Ginzburg

 


 

«“As Pequenas Virtudes” (1962) reúne textos publicados na imprensa a partir de 1944. Ginzburg tem evidente talento narrativo, um estilo conciso e uma atenção ao pormenor que lembra um espelho a andar pelas ruas (a imagem vem de Stendhal). Mas o sofrimento, confessa, enfraqueceu-lhe a fantasia e avivou-lhe a memória. É talvez por isso que recorre tanto ao contraste. Assim, num elogio da civilizada Inglaterra, diz a certa altura acerca da Itália: “É um país onde reina a desordem, o cinismo, a incompetência, a confusão. E, todavia, nas ruas, sente-se a inteligência circular, como um sangue vivo.” (…)
A inquietação ética domina outros ensaios, como o que dá título ao livro. Ginzburg defende que se ensine às crianças as grandes virtudes (a generosidade, a coragem, a franqueza, a abnegação) e não as pequenas (a poupança, a prudência, a astúcia, a diplomacia), uma vez que as pequenas são adquiridas e fáceis, enquanto as grandes, ainda que instintivas, precisam de estímulo, até porque são virtudes sem qualquer recompensa social. É o cinismo que ela detesta acima de tudo, e por isso, num artigo de 1951, critica o culto “cool” do silêncio, enquanto noutro texto evoca o amigo Cesare Pavese, que tinha a tristeza de um adolescente e uma incapacidade de deixar de ser adolescente; não sendo um cínico, as tortuosas complicações de pensamento” de Pavese tornavam-no inapto para o amor e o quotidiano, que são ainda, sugere Ginzburg, aquilo que nos salva.»

[Pedro Mexia, «Queda iminente», «E», 2021/08/07]

«As Pequenas Virtudes» e outras obras de Natalia Ginzburg estão disponíveis em: https://relogiodagua.pt/autor/natalia-ginzburg/ 

 

Sem comentários:

Enviar um comentário