9.5.21

De Instante, de Wisława Szymborska

 



«INSTANTE


Vou pela ladeira da colina verdejante.

Erva, florinhas na erva,

como nas gravuras para crianças.

O céu enevoado, a ficar azul.

A vista para as outras colinas propaga-se no silêncio.


Como se por aqui não tivesse havido nenhuns câmbricos, silúricos,

rochas rosnando umas às outras,

abismos sublevados,

nenhumas noites em chamas

nem dias em baforadas de trevas.


Como se por aqui não se tivessem deslocado planícies

em febris delírios

e gélidos calafrios.


Como se somente em outro lugar se tivessem revoltado os mares

e se rompessem as orlas dos horizontes.


São nove e trinta, hora local.

Tudo no seu lugar e em impecável concórdia.

No vale, a pequena ribeira na qualidade de pequena ribeira.

A vereda sob a forma de vereda desde sempre e para sempre.

O bosque sob o pretexto de bosque por toda a eternidade, ámen.

No alto, os pássaros no papel de pássaros em voo.


Até onde a vista alcança, reina o instante.

Um desses instantes terrenos

aos quais se pede que perdurem.» [pp. 12-13]


Instante e Paisagem com Grão de Areia estão disponíveis em https://relogiodagua.pt/autor/wislawa-szymborska/

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